Cinco filmes assistidos durante o mês que merecem destaque:
segunda-feira, 31 de maio de 2021
domingo, 30 de maio de 2021
PL►Y: Relíquia Macabra
Nos últimos anos um grupo de diretores estão procurando fazer filmes de terror na contramão do saturado mercado de serial-killers, monstrengos assassinos e lunáticos que vigoraram no gênero por tanto tempo. Em forma de narrativas mais contidas e atuações intimistas, o gênero passa por uma espécie de renovação que lhe cai muito bem e tem como expoentes Robert Eggers (A Bruxa/2015 e O Farol/2019) e Ari Aster (Hereditário/2018 e Midsommar/2019). Em 2020 duas diretoras entraram para o grupo, uma foi a inglesa Rose Glass (Saint Maud) e a outra foi a australiana Natalie Erika James deste Relic, que no Brasil ganhou o nome de Relíquia Macabra. Acho que o título brasileiro não cai muito bem às ideias do filme, já que de fato existe uma relíquia no filme (um vitral ligado a um trauma presente na história), no entanto, o horror do filme se relaciona muito mais às relações das três mulheres e o medo do abandono, do envelhecimento e da morte (algo que conforme a última cena deixa claro, deve se perpetuar no trio). Quem está acostumado à esta renovação do gênero já sabe que o horror é mais psicológico e se desenvolve aos poucos, especialmente pelo constante flerte com a loucura de forma que o espectador não sabe ao certo o que está acontecendo até o desfecho. Aqui, mãe (Emily Mortimer) e filha (Bella Heathcote) vão para a casa da avó (Robyn Nevin), que está desaparecida e ninguém sabe ao certo o que aconteceu com ela. A casa está visivelmente deteriorada, com madeiras envelhecidas, podres e bolores subindo pelas paredes e, para completar, até os poucos vizinhos percebem que aquela senhora andou com um comportamento estranho nos últimos tempos. A casa é arrepiante por si só, com seu potencial para ser mal assombrada em seu processo de deterioração e barulhos soturnos. Eis que a vovó aparece e o que poderia ser interpretado como traços de senilidade começa a se tornar algo muito mais complicado, especialmente pelo estranho hematoma que ela exibe no peito. Uma mancha escura que se assemelha a mesma que pode ser vista em diversas partes da casa. A coisa fica mais estranha quando a vovó é acolhedora em um instante e no outro é capaz de ser agressiva e impaciente, aguçando no espectador a curiosidade e uma certa perplexidade. Nos minutos finais o filme deixa a sugestão de lado e parte para o tipo de terror mais comum com ataques, sangues e monstros estranhos e deixa na cabeça do espectador uma interrogação ainda maior, no entanto, o que a diretora parece dizer é que não adianta tentar fugir: o futuro é inevitável. Relíquia Macabra deixa a impressão que demora muito para engrenar, mas na verdade se constrói nos laços entre as três personagens, evidenciando posturas que se reproduzem e elas parecem não perceber. Reside aqui uma estranheza que lhe rendeu comparações com Hereditário, mas não chega a ousar tanto. Visivelmente com orçamento mais modesto e menos radicalismo, Relic se comporta como um exercício interessante de suspense até que toda sua estranheza se revela. Ainda que soe pouco empolgante para a maioria dos espectadores, a diretora Natalie Erika James demonstra ser bastante promissora no gênero. Tendo aqui a sua carta de apresentação é o tipo de cineasta em que vale a pena ficar de olho nos projetos futuros.
Relíquia Macabra (Relic / Austrália - EUA / 2020) de Natalie Erika James com Emily Mortimer, Robyn Nevin, Bella Heatchcote, Chris Bonton e Steve Rodgers. ☻☻☻
#FDS Jodie Foster: O Mauritano
Mohamedou Ould Slahi (Tahar Rahim) foi um dos casos reais de suspeitos presos após os atentados de onze de setembro que foram levados pelos Estados Unidos para a base em Guantánamo, em Cuba, e comeu o pão que o Tio Sam amassou em torturas variadas sob as acusações de ter sido o responsável pelo recrutamento que gerou os ataques. Embora jurasse ser inocente, seu caso evidencia como um conjunto de direcionamentos tendenciosos era capaz de forjar uma rede de relações que faria qualquer um que se encaixasse em determinado perfil parecesse suspeito. Eis que seu livro (Diários de Guantánamo) foi lançado e se tornou um best-seller, tornando pública a sua história e a desumanidade dos procedimentos que serviram apenas para que os prisioneiros dissessem o que os agentes queriam que fosse dito. Após anos como prisioneiro, sem que houvesse sido feita qualquer acusação sobre ele, sua situação chamou a atenção da renomada advogada Nancy Hollander (Jodie Foster), que percebia todos os equívocos que giravam em torno do caso construído na histeria coletiva que se abateu sob os EUA - e que parece ter feito boa parte da população ter perdido o senso crítico e a possibilidade de questionar suas próprias ações. No fundo, este é o ponto mais forte de O Mauritano, a capacidade que as autoridades possuem de gerar uma verdade e fazer toda a realidade ter que se curvar perante a construção dela. É o tipo de filme que cai como uma luva para a inquietação de Kevin MacDonald (que funciona muito melhor quando tem em mãos roteiros de carga política como O Último Rei da Escócia/2006 e Intrigas de Estado/2009) que sabe construir a tensão e a ambiguidade dos seus protagonistas com grande desenvoltura. O filme também se beneficia muito com o trabalho de seu elenco. É ótimo matar a saudade de Jodie Foster (que infelizmente filma pouco ultimamente) na pele de uma sagaz advogada que é mais esperta e possui uma clareza de ideias muito maior do que os outros personagens que cruzam seu caminho (fruto de vivências em tribunais desde a época do Vietnã), não é por acaso que Jodie levou o Globo de Ouro de atriz coadjuvante para a casa, no entanto, não podemos esquecer do excelente desempenho de Tahar Rahim, que talvez tenha aqui o seu melhor papel desde o inacreditável O Profeta (2009) – e o acho cada vez mais a cara de Richard Gere. Quando a narrativa se prende aos dois o filme funciona que é uma beleza, pena que ele desliza toda vez que aparece o outro lado da moeda centrado no advogado vivido por Benedict Cumberbatch, tudo em volta dele soa tão clichê e previsível que parece postiço durante todo o filme, apesar de Benedict ser um ótimo ator, ele não consegue fazer milagres com a parte mais tediosa da história, sorte que esta parte é pequena. Na maior parte do longa, a narrativa é dinâmica e sabe utilizar os efeitos que brincam com a percepção da realidade aliada à ambiguidade do protagonista. Muita gente compara o filme à O Relatório (2019) lançado em 2019 e que foi esquecido das premiações, de fato, os dois filmes parecem complementares, mas O Mauritano ainda me parece mais interessante.
O Mauritano (The Mauritanian / Reino Unido - EUA / 2020) de Kevin MacDonald com Tahar Rahim, Jodie Foster, Benedict Cumberbatch, Shailene Woodley, Zachary Levi e Clayton Boyd. ☻☻☻☻
sábado, 29 de maio de 2021
#FDS Jodie Foster: Mentes Que Brilham
sexta-feira, 28 de maio de 2021
#FDS Jodie Foster: Acusados
Jodie: desafiando a cultura do estupro. |
Tema deste #Fim de Semana, a carreira de Alicia Christian Foster começou muito cedo no mercado publicitário. Ainda criança foi ela que aparecia no famoso anúncio da Coppertone em que um cachorro puxava o traje de banho da menina para revelar o bronzeado. No seu primeiro trabalho como atriz na televisão ela tinha sete anos, foi no Doris Day Show (1969), depois veio a participação em Disneylandia (1970), Bonanza (1972), Família Dó Ré Mi (1973), Família Adams (1973)... além dos trabalhos como dubladora em desenhos como Scooby Doo (1972) - num início de carreira que se mistura com a história da TV americana. Apesar de ter feito papéis para o cinema durante este período, ela chamou atenção do diretor Martin Scorsese quando a escalou para o premiado Alice não Mora mais Aqui (1974) para depois lhe garantir respeito como a garota de programa em Taxi Driver (1976) quando a atriz tinha apenas quinze anos. O trabalho de gente grande lhe garantiu a primeira indicação ao Oscar e provou que ali existia uma estrela que desafiava padrões. Jodie cresceu com fama de garota difícil em Hollywood. Nada delicada e sendo considerada fria perante as outras atrizes adolescentes de sua geração que cresciam diante da câmera. Embora tivesse um sucesso aqui e outro ali, sua carreira não apresentava mais o mesmo lampejo de interesse da indústria até que ela ressurgiu em Acusados, num papel complicado e com um roteiro provocador que permanece atual até hoje. Em tempos de debates acerca da violência contra a mulher, a cultura do estupro e denúncias de abuso, o filme de Jonathan Kaplan ainda é capaz de chocar e chamar a plateia para refletir sobre os estigmas produzidos em nossa sociedade. Afinal, após Sarah Tobias (Jodie Foster) ser estuprada em um bar, o que parece estar em julgamento não é a postura dos homens que praticaram o ato e sim, a postura de Sarah, que usava roupas curtas, bebia, fumava e dançava num bar cheio de homens. O roteiro faz questão de não apresentar Sarah como uma donzela indefesa, ao mesmo tempo em que indaga à plateia "e daí?", nada do que ela fizesse justificaria o que aconteceu naquela que se tornou a pior noite de sua vida. Ao mesmo tempo, por vezes ter sua vida pessoal exposta pela mídia e tribunal parece mais uma colagem de humilhações. A sorte é que lutando pelo seu caso está uma outra mulher, Kathryn Murphy (Kelly McGillis que estava no auge e que anos depois disse que aceitou o papel por ter sobrevivido a um estupro e considerar que o tema merecia ser abordado com a devida seriedade no cinema), que é capaz de perceber todos os absurdos que se acumulam em torno do caso. Kathryn quer não apenas que os estupradores sejam condenados pelo que fizeram, ela quer provar que aqueles que testemunharam o ato e não tentaram impedi-lo de acontecer são cúmplices e portanto, culpados sobre o ocorrido. Acusados se constrói como um filme de tribunal diferente, afinal, já conhecemos os culpados e o que interessa é como aquele acontecimento revela uma série de posturas e situações que constroem uma verdadeira rede de mazelas, muito bem representado pela inversão total do caso que parece julgar a vítima e não os criminosos. Embora o filme tenha sido somente indicado ao Oscar de Melhor Atriz, rendendo a primeira estatueta da carreira de Jodie, revisto hoje, o filme de Kaplan permanece relevante, especialmente pela marcante ousadia de Jodie desafiar os preconceitos na plateia na construção de sua personagem. Embora seja pouco lembrado, o filme merece ser redescoberto.
Acusados (The Acused / EUA - Canadá / 1988) de Jonathan Kaplan com Jodie Foster, Kelly McGillis, Bernie Coulson, Leo Rossi, Tom O'Brien e Steve Antin. ☻☻☻☻
domingo, 23 de maio de 2021
FILMED+: O Mensageiro
PL►Y: Depois a Louca Sou Eu
Procurando um filme para assistir despreocupado, encontrei Depois A Louca Sou Eu, adaptação do livro biográfico de Tati Bernardi, estrelado por Débora Fallabella (que eu adoraria ver em mais filmes) e dirigido por Júlia Rezende. Sei que muita gente vai olhar torto para uma comédia em que existem momentos torturantes para a protagonista, mas vejo que o grande desafio do filme é encontrar este equilíbrio perigoso sem parecer ofensivo ou de mal gosto. Eu achei que a produção funciona muito bem com o que tem em mãos e confesso que me identifiquei em muitos momentos, especialmente com a ideia fixa de que tudo pode dar errado quando algo bom cruza o seu caminho. No entanto, a Dani (a protagonista) precisa de medicamentos para lidar com o que para muita gente seria normal e ainda procura terapias alternativas para exorcizar seus problemas. É neste ponto que o filme ganha contornos muito interessantes, abordando tanto as angústias quanto a sensação de tranquilidade, euforia ou até sensação alguma (através de medicamentos) vividas pela personagem. O filme faz questão de ser divertido, mas sem perder a mão quando a barra pesa (como aquela cena em que ela caminha e sente-se ridicularizada por todos os personagens, ou o momento em que tudo pareceu ter acontecido bem numa entrevista redentora e na verdade foi tudo um desastre em rede nacional). Entre as crises e problemas com a percepção da realidade (seja por conta própria ou por conta dos medicamentes), Debora Falabella realiza aqui mais um trabalho marcante em sua carreira no cinema brasileiro, conseguindo inserir camadas de humor e drama em uma personagem que poderia ter uma nota só e primar pela chatice diante da câmera, com seu trabalho, não vemos uma caricatura, mas uma pessoa com qualidades e conflitos. Também ajuda muito a edição esperta que faz graça com as mentiras que Dani conta ou cede às lembranças e, principalmente, intensifica as oscilações entre sentir-se bem e sentir-se muito mal. Outro detalhe que faz a diferença é que quando a trama parece enveredar pela comédia romântica, o faz de forma diferente, sem que um namorado seja a solução de todos os seus problemas, afinal o Gilberto (o excelente Gustavo Vaz que era parceiro de Débora na vida real e isso explica muito da química irresistível entre os dois) é psicanalista mas tem seus próprios dilemas para lidar quando o assunto é romance (ou a morte do pai que vai muito bem de saúde, obrigado). Depois A Louca Sou Eu consegue ser tão engraçado quanto angustiante e, boa parte deste mérito vem da sinceridade com que Tati Bernardi olha para a vida e para si.
Depois a Louca Sou Eu (Brasil/2021) de Julia Rezende com Débora Falabella, Gustavo Vaz, Yara de Novaes, Beatriz Oblasser, Débora Lamm, Rômulo Arantes Neto, Duda Batista, Elizângela, Evandro Mesquita e Cristina Pereira. ☻☻☻☻
sexta-feira, 21 de maio de 2021
NªTV: Halston
Roy Halston se tornou um dos maiores nomes da moda mundial quando esta era dominada por nomes europeus. Nascido em Iowa no ano de 1932, seus planos sempre foram mais ambiciosos do que a realidade local poderia compreender. Ele ganhou fama quando a primeira dama Jaqueline Kennedy apareceu com uma de suas criações, o chapéu pillbox (aquele que parecia uma caixinha de base arredondada) e o tornou uma febre no mundo da moda. Outras criações fizeram a glória de Roy, como a criação do ultrasuede (um tipo de camurça que resistia à água), um badalado perfume de frasco exótico e toda uma coleção de roupas de costuras minimalistas, cortes precisos e uma leveza que proporcionava um movimento quase hipnotizante - e que caiu nas graças de Liza Minnelli que apelou para o estilista para melhorar seus figurinos no clássico Cabaret (1972). Você deve estar se perguntando o motivo de não ouvir falar muito de um nome que já foi tão badalado no mundo fashion... o motivo pode ser visto na minissérie da Netflix produzida por Ryan Murphy e protagonizada por Ewan McGregor (em momento inspiradíssimo). Apesar de ser um gênio no corte e na costura, Halston nunca foi muito bom em administrar os negócios, motivo pelo qual mesmo em tempos de enorme procura por suas criações, ele não conseguia dar conta da produção por não ter dinheiro para organizar a linha de produção. Este foi o motivo de aproximar-se cada vez mais das grandes lojas de departamento, algo visto com desdém por alguns, mas que garantiu financiamento para suas criações fora da caixa do mundo da moda. Li muitos comentários reclamando da forma como o personagem é apresentado como temperamental, arrogante, vaidoso, presunçoso e blábláblá mas, sinceramente: e daí? Ainda existem mortais que acreditam que a maioria dos grandes nomes do mundo da moda não são verdadeiras divas? Podem até dizer que esta parte do roteiro não acrescenta novidade alguma para o que se espera de um grande nome da moda e azar de quem acha que isso depõe contra o artista. Assim como a parte em que sua homossexualidade é abordada com a cara da liberação dos anos 1970 pós revolução sexual e antes da chegada da AIDS nos anos 1980. Quem acha que é um clichê, lamento informar, mas foi isso mesmo que aconteceu no período. Foi triste. Foi feio. Foi traumatizante e motivou discursos moralistas que perduram até hoje (e que a série apresenta de forma até muito discreta). Além disso, Ryan Murphy tem cacife suficiente para apresentar estes momentos sem parecer um julgamento de seu protagonista, ele é daquele jeito, goste dele ou não. Além disso, Ryan teve a ótima ideia de escalar o escocês Ewan McGregor para personificar o estilista com todos os predicados que ele merece, sendo impossível não se comover com os momentos em que a vida sai do controle junto com sua vida profissional. Atrevo-me a dizer que se fosse um filme, McGregor poderia ser indicado ao Oscar pela primeira vez, como não é, os prêmios de TV já tem um grande nome na disputa de melhor do ano (e ele é seguido de perto por Krysta Rodriguez que pode não ter o jogo a ginga de Liza Minelli, mas capta a essência da estrela com precisão). Depois da irregularidade das suas últimas produções da Netflix, Halston mostra-se um grande acerto. Acho que nem precisa comentar a exuberância visual da série que já se tornou uma marca de Murphy (se Murphy acertou este detalhe até mesmo o claudicante Ratched/2020, imagina o que ele não faz em torno de um ícone da moda americana?). Halston é tão envolvente que pode ser visto todo de uma vez, como um grande filme.
Halston (EUA-2021) de Daniel Minahan com Ewan McGregor, Rebecca Dayan, Krysta Rodriguez, Rory Culkin, Sullivan Jones, Regina Shcneider e Vera Farmiga. ☻☻☻☻
quarta-feira, 19 de maio de 2021
Pódio: Margot Robbie
Bronze: A Esposa Esperta. |
Prata: A PHD doidona. |
Ouro: A Patinadora Arruinada. |
PL►Y: Dreamland
Margot e Finn: amor bandido. |
Revelada para Hollywood com o aval de Martin Scorsese, a australiana Margot Robbie aprendeu rápido que se quisesse fugir do papel de "a mulher linda do filme" teria que partir para produção. Assim, ela continua linda, mas escolhe papéis em que demonstra o motivo de ser uma das atrizes mais interessantes do cinema dos Estados Unidos. Assim, ela produziu Eu, Tonya (2017) que lhe rendeu a primeira indicação ao Oscar de sua carreira (a segunda veio com O Escândalo/2019) - vale lembrar que ela também é produtora do oscarizado Bela Vingança (2020) e faz um tempinho que chegou no Amazon Prime Video este Dreamland em que vive uma fugitiva da polícia no período da Grande Depressão da economia norte-americana. Aqui ela e o parceiro (Garrett Hedlund) precisam lidar com as consequências de um assalto a banco mal sucedido. Enquanto fogem, algumas vítimas ficam pelo meio do caminho e ela termina se escondendo em um celeiro. Logo o jovem Eugene (Finn Cole) a conhece e tenta ajuda-la e, logicamente, irá se apaixonar por ela até que problemas acontecem como em todo amor bandido. Fosse apenas sobre o relacionamento dos dois já estaria de bom tamanho, mas o filme quer mais. Ele tenta explorar o conflito entre Eugene e o padrasto policial (Travis Fimmel), a insatisfação do rapaz em viver num lugar em que nada acontece e ainda é narrado pela pela irmã de Eugene especulando sobre os sentimentos do casal. O início do filme é bastante promissor, mas depois quando o romance precisa se destacar, o filme se torna cada vez menos interessante - e a perseguição policiar vira o nosso maior interesse na reta final (e nem é grandes coisas). Dreamland tem alguns detalhes interessantes, como a ideia de inverter os papéis e deixar o papel de frágil para o rapaz da história, mas convenhamos que Finn Cole é engessado demais para convencer no papel e o pior, não tem química alguma com Margot Robbie (o que seria fundamental para que o filme funcionasse). Enquanto a trama amontoa referências a filmes do gênero, Margot segue plena com seu porte e sorriso de diva do cinema, pena que ao seu redor os outros personagens não se desenvolvam tão bem no andamento que se torna cada vez mais esquemático e previsível. É verdade que o filme tem seus bons momentos, como transmitir a a sensação de estarmos no centro de uma tempestade de areia e ousa fazer uma cena de banho em que a câmera concentra-se no rapaz e deixa sua estrela fora da tela quase o tempo todo. O diretor Miles Joris-Peyrafitte (que antes chamou atenção com As You Are/2016 - que eu assisti quinze minutos e dormi) demonstra ser esforçado para manter a trama funcionando, mas paga o alto preço do longa parecer com tantos outros.
Dreamland (EUA/2019) de Miles Joris Peyrafitte com Margot Robbie, Finn Cole, Travis Fimmel, Kerry Condon e Garrett Hedlund. ☻☻☻
terça-feira, 18 de maio de 2021
PL►Y: A Mulher na Janela
Anna Fox (Amy Adams) sofre de agorafobia. Sair de casa para ela é uma verdadeira tortura. Ela costuma conversar com o ex-marido (Anthony Mackie num papel minúsculo) que ficou com a guarda da filha depois que o casamento foi desfeito. Ela tem contato com poucas pessoas em sua rotina, um deles é o terapeuta (Tracy Letts bom ator e reconhecido dramaturgo que assina o roteiro desta adaptação do livro de AJ Finn) e o outro é David (Wyatt Rusell), o rapaz misterioso para quem alugou o porão para ganhar uns trocados. Presa dentro de casa a maior parte do tempo, Anna consome muitos remédios, e garrafas de bebida alcoólica, tento como maior diversão assistir filmes clássicos na televisão até adormecer e olhar a vizinhança através da janela. Eis que um dia ela percebe que tem novos moradores no apartamento em frente e acaba se aproximando da recém chegada vizinha (Julianne Moore) e seu filho (Fred Hechinger). Os dois com posturas bastante diferentes e marcadas pelo relacionamento com o patriarca da família (Gary Oldman). Tendo estas peças postas no filme, Anna acredita ter testemunhado um crime e a trama escancara de vez sua referência com o clássico Janela Indiscreta (1954) de Alfred Hitchcock. Dirigido por Joe Wright, seria uma maldade quase covarde comparar os dois filmes. Hitch é inimitável, mas Joe já provou em várias de suas obras anteriores que tem talento suficiente para filmar, tomando cuidado com os cortes, os planos, enquadramentos, ritmo, uso de cores, sobreposição de imagens (as de Anna com com os filmes que assiste são bastante interessantes), sem ter medo de por vezes usar até recursos teatrais como se a história se passasse num palco. Com um diretor destes, craque em adaptações literárias (entre elas Orgulho e Preconceito/2005 e Desejo e Reparação/2007), e um elenco deste quilate nada poderia dar errado. Ou pelo menos até que o estúdio inventasse de fazer sessões de teste de audiência e retalhar o filme todo, alterando completamente o tom, especialmente de sua reta final com sabor de pastel de vento estragado. Wright não escondeu a surpresa com a reação negativa ao corte original de seu filme e ficou bastante frustrado em ter que mexer em sua obra o deixando um tanto desengonçado perante a total desistência de investir nas ambiguidades da história pautada na percepção de sua protagonista. O resultado é que o filme que começa bem e cheio de possibilidades termina beirando o desastre. Depois de sabotarem o filme, venderam para a Netflix que o colocou entre os mais assistidos (apesar das críticas negativas). Um aspecto do filme vale um comentário especial é sua atriz principal: Amy Adams. Não é fácil carregar seis indicações ao Oscar e nenhuma vitória, além da expectativa de todo projeto poder ser aquele em que será finalmente lhe render o reconhecimento da Academia. Amy é uma ótima atriz, mas seus últimos dois filmes devem ter feito soar o alarme de sua agente, afinal, este ao lado de Era Uma Vez um Sonho de Ron Howard (ambos em cartaz na Netflix) foram adaptações promissoras que saíram pela culatra. Sorte que Amy tem crédito (mas até quando?).
A Mulher na Janela (The Woman in the Window/EUA-2021) de Joe Wright com Amy Adams, Gary Oldman, Julianne Moore, Fred Hechinger, Wyatt Russell, Tracy Letts e Jennifer Jason Leigh. ☻☻
PL►Y: Tudo de Novo
sábado, 15 de maio de 2021
4EVER: Eva Wilma
PL►Y: Oxigênio
Mélanie: angústia quase solitária. |
Tenho alguns problemas com filmes pautados em atores solitários em um verdadeiro tour de force. A coisa também complica quando o filme é ambientado em somente um cenário, mas isso um diretor esperto pode contornar com os artifícios que ainda podem ser utilizados para alavancar a narrativa. Também ajuda se o roteiro não infla demais a história e depois murcha gradativamente jogando fora tudo o que construiu até então. Parece simples, mas as armadilhas são muitas. É preciso ser envolvente, ter uma tensão crescente, uma dinâmica imagética fluente e um texto competente para dar suporte o artista que tem em mãos. Ou seja, não é uma tarefa fácil, mas também não é impossível. O elogiado Oxigênio que entrou em cartaz na Netflix consegue se sair bem nestes critérios, a começar por ter Mélanie Laurent (a eterna Joshana de Bastardos Inglórios/2009 de Tarantino) no centro da história. Na trama ela acorda dentro de uma câmara criogênica e não faz a mínima ideia de como foi parar ali. Ela também não lembra quem é, sua história ou para onde vai. Na maior parte do tempo interage com a Inteligência Artificial responsável por zelar por sua segurança dentro da câmara. Vale ressaltar que enquanto busca por respostas, suas conversas, emoções e reações afetam diretamente o consumo da quantidade limitada de oxigênio daquele recipiente - e pode até gerar a sua morte. É interessante como para o roteiro se desenvolver revelando sempre mais sobre a história de sua personagem, ela corre cada vez mais riscos. Conforme ela consegue se comunicar com outros personagens e redescobre um pouco mais de sua história, o diretor utiliza flashbacks para ilustrar suas memórias e o filme começa a preparar algumas surpresas para o espectador que cria suas próprias teorias enquanto assiste ao filme. Lá pela última meia hora algumas revelações mudam bastante o contexto do filme e insere aspectos de cinema catástrofe. Oxigênio é um exercício interessante, tem um belo trabalho de luzes em sua fotografia que o torna bonito visualmente, além de dar a chance de Mélanie ser mais uma vez lembrada pelo seu talento (é inexplicável como os produtores parecem não ligar muito para ela). Mas voltando às armadilhas que citei neste tipo de filme, pode assistir despreocupado, o filme não murcha em sua reta final, apenas ousa ao ir além do que o espectador pode esperar.
Oxigênio (Oxygène / França - EUA / 2021) de Alexandre Aja com Mélanie Laurent, Malik Zidi e Laura Boujenah e Marc Saez. ☻☻☻
quinta-feira, 13 de maio de 2021
§8^) Fac Simile: Elijah Wood
Elijah Jordan Wood |