terça-feira, 31 de dezembro de 2024

MELH✪RES DE 2024

Chegamos ao fim de mais um ano cinematográfico e com ele preparei a tradicional lista de filmes favoritos do ano que termina. Tive a impressão que foi um período fraco para o cinema, muito por conta dos atrasos decorrentes das greves de 2023 que afetou o calendário de lançamentos (e muitos que eram aguardados com grande expectativa naufragaram feio). Ainda assim, tivemos filmes celebrados do ano passado que só chegaram por aqui este ano, além de alguns lançamentos interessantes para a nossa alegria. Entre os meus favoritos, algumas categorias forma difíceis de escolher, especialmente a de Melhor Filme em que tive que avaliar questões diferentes para um desempate entre meus dois favoritos do ano (que aparecem lado a lado ao final deste post), vale lembrar que suas atrizes também eram as favoritas de suas categorias ao lado de uma veterana que andava esquecida (e o empate na direção também se repetia). Disputa acirrada! A seguir os favoritos de 2024:

CINEASTA REVELAÇÃ

MELHOR R✪TEIRO

ELENC

ATRIZ C✪ADJUVANTE 

AT✪R COADJUVANTE

ARTISTA REVELAÇÃ

MELH✪R ATRIZ

MELHOR AT✪R

MELHOR DIREÇÃ

FILME DO AN

Quais foram os seus favoritos de 2024?

Feliz Ano Novo, pessoal!

Nos vemos em 2025!

Que ele traga bons filmes para nós!

quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

4EVER: Ney Latorraca

25 de julho de 1944 ✰ 26 de dezembro de 2024

Antonio Ney Latorraca nasceu na cidade de Santos, São Paulo. Filho de um crooner e uma corista que trabalhavam em um cassino, a situação da família ficou bastante complicada quando um decreto determinou o fechamentos dos estabelecimentos em todo o país. Sendo afilhado de Grande Otelo, Ney começou a atuar aos seis anos de idade em uma radionovela da Record. Atuando em teatro estudantil, sua chance no teatro profissional veio em 1965 ao ser aprovado para uma peça de Plínio Marcos. Após alguns trabalhos nos palcos, resolveu cursar Escola de Arte Dramática. Em 1968 atou na revolucionária novela Beto Rockefeller e em 1975 estreou na Globo com a novela Escalada e no ano seguinte estrelou Estúpido Cupido. Em 1980 atuou na versão cinematográfica de O Beijo no Asfalto e em 1985, fez sua novela de maior sucesso: Um Sonho a Mais. Já conhecido por seus trabalhos no cinema, no teatro e na televisão, em 1986 fez história com a montagem de O Mistério de Irma Vap ao lado de Marco Nanini. O ator também fez papéis importantes na debochada TV Pirata (1988) e na novela Vamp (1991), se tornando um dos grandes nomes da comédia brasileira. Sua última novela foi Novo Mundo em 2017. Ney faleceu em decorrência de uma sepse pulmonar.

terça-feira, 24 de dezembro de 2024

Favoritos da TV em 2024

Confesso que fiquei preocupado quando percebi que se aproximava o tempo de fazer minha lista de melhores programas de televisão do ano. Não sei o que houve em 2024, mas tive menos paciência com séries e minisséries, deixei a grande maioria após alguns episódios (e isso inclui várias elogiadas do ano). Poucas eu consegui (ou aguentei) ver até o final, não sei, me incomodou a ideia de ver mais do mesmo - especialmente quanto o assunto era violência estilizada ou tramas que demoram demais para avançar. Várias ficaram pela metade. Portanto, ver até o final se tornou um critério para as melhores do ano em minha humilde opinião (talvez as outras tenham outra chance quando eu estiver em uma vibe diferente).   Sendo assim, meus favoritos do ano foram os seguintes:

MINISSÉRIE DO AN
 
ATR COADJUVANTE
 
ATRIZ CADJUVANTE
 
MELHR ATRIZ
 
MELHOR ATR
 
SÉRIE DO AN

segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

Na Tela: Maria

Jolie: caras, bocas e poses em filme de Larraín.

O chileno Pablo Larraín já deixou claro que curte criar biografias de celebridades femininas famosas dentro de um estilo bastante particular. Na contramão das biopics que viraram moda em Hollywood seguindo uma cartilha óbvia de acontecimentos importantes na vida dos biografados (como se apenas isso ajudasse a compreender a identidade dos mesmos), Larraín costuma escolher um recorte bastante específico de suas divas e construir filmes em que o foco está na personalidade delas. Foi assim com Jackie (2016), que a performance como Jaqueline Kennedy rendeu prêmios e uma indicação ao Oscar para Natalie Portman. Depois ele fez o mesmo com Spencer (2021), que gerou elogios para Kristen Stewart cair nas graças da Academia e entrar no páreo do Oscar de melhor atriz. Agora é a vez de Angelina Jolie estar cotada para o Oscar por sua performance como Maria Callas. A dona de uma das maiores vozes da história recebe aqui uma narrativa com foco nos últimos anos de sua vida ao final dos anos 1970. Callas estava em um período conturbado em sua vida pessoal e profissional, já que se recuperava da decepção amorosa do relacionamento com o milionário Aristotles Onassis (vivido aqui por Haluk Bilginer) e a voz não era mais a potência de antes. Aqui, Callas reflete um pouco sobre a vida como se estivesse participando da produção de um longo programa para a televisão (sob o comando de um jornalista vivido por Kodi Smit-McPhee), pensa sobre sua relação com a música, a dificuldade para cantar novamente, sua postura diante do público, da imprensa, seu relacionamento com Onassis e seus fieis empregados, Ferruccio (Pierfrancesco Favino) e Bruna (Alba Rohrwacher). O texto de Steven Knight (também responsável pelo roteiro de Spencer) consegue ser ainda mais intimista do que as outras biopics do diretor, embora invista ainda mais no imaginário da protagonista enquanto ela abusa de medicamentos e torna sua saúde ainda mais frágil. A fotografia é perfeita, os figurinos são bem feitos, as locações são lindas, no entanto, se existe algo que torna o filme de Larraín um exercício de paciência é a performance de Angelina Jolie. Cotada para as premiações, a atriz que filma cada vez menos, disse ter feito uma pesquisa árdua para viver Maria Callas nas telas e eu realmente gostaria de acreditar que ela executou um belo trabalho, mas tudo se resume à uma mesma expressão durante todo o filme a pose de quem faz um ensaio fotográfico em forma de reality show. Não consigo enxergar Maria Callas na tela, apenas lembro que é a diva quando escuto seu canto dublado. Quero deixar registrado que não vejo nada demais do filme (sabiamente) fazer a atriz dublar a cantora, o problema é que a atuação de Angelina é arrastada, unidimensional e cansativa. Obviamente que a atriz atrai muita atenção para a produção, mas dizer que ela merece prêmios pelo trabalho é um grande exagero. Imagino que viver Callas em um filme de Larraín seja uma chance de ouro para qualquer atriz, pena que Jolie não alcança todas as notas necessárias para viver uma mulher de personalidade tão marcante. Entendo que muita gente gosta das caras e bocas da atriz, mas acho pouco para viver Maria Callas no cinema, em cena ela nunca é a personagem, apenas Angelina Jolie querendo mais um Oscar na estante. 

Maria (Itália / Alemanha / Chile / EUA - 2024) de Pablo Larraín com Angelina Jolie, Pier Francesco Favino, Alba Rohr Rorhwacher,  Kodi Smit-McPhee, Valeria Golino, Haluk Bilginer e Caspar Phillipson. ☻☻

PL►Y: Jurado nº2

Nicholas: dilema moral em julgamento.

Justin Kemp (Nicholas Hoult) parece levar uma vida pacata com seus trabalhos para revistas e ao lado da esposa, Allison (Zoey Deutch), que está prestes a ter um bebê. A rotina dele muda quando é escalado para ser jurado, ele até tenta escapar da tarefa, mas não tem jeito, ele é escolhido para participar do julgamento no posto de jurado número 2. O crime em questão é sobre uma jovem que é encontrada morta após uma discussão no bar com o namorado que, visivelmente perde o controle. Prova em si de que foi o rapaz que cometeu o crime não existe, existem apenas indícios pelo seu comportamento suspeito naquela noite. Conforme os relatos avançam, seria melhor que Justin realmente não fizesse parte do júri, já que ele parece ter ligação direta com o crime. Quanto mais o julgamento avança, mais Justin começa a questionar a sua presença ali e, mais do que isso, passa a ter mais certeza da inocência do acusado além de sua própria culpa, embora, nem ele saiba ao certo o que aconteceu naquela noite. É interessante como Jurado Nº2 tem como cenário um ambiente em que busca-se a verdade em nome da justiça, mas que por outro lado, compõe cada vez mais um cenário de incertezas, tanto sobre o veredicto quanto decisões a serem tomadas e suas consequências. Se por um lado existe a certeza de que o acusado tinha um comportamento abusivo com a namorada (e alguns acreditam que cedo ou tarde algo ruim iria acontecer), por outro, existe um personagem que tenta corrigir sua postura diante dos vícios e da família que planeja construir. Embora o roteiro de Jonathan A. Abrams invista em alguns clichês dos filmes de tribunal (como a personalidade estereotipada de alguns jurados e a promotora que quer se promover com o caso, esta vivida com segurança por Toni Collette), o filme amplia os dilemas dos personagens que estão cada vez mais diante de uma verdade desconfortável, enquanto outros permanecem presos à uma percepção já pré concebida sobre o veredicto. Dirigido por Clint Eastwood, mais uma vez o cineasta segue sua linha direta e um tanto seca na direção, sem firulas ou melodramas, deixando muito por conta do espectador tirar suas próprias conclusões sobre o desenrolar daqueles fatos. Não fosse toda a má vontade do estúdio (a Warner que perdeu muita grana com Coringa2 e só tem olhos para Duna2 na temporada de prêmios),  o longa poderia até figurar em algumas categorias das premiações que se aproximam. Nicholas Hoult está muito bem no papel principal com sua cara de bom moço que fez coisas erradas no passado e confesso que gosto do rapaz desde que ele era o moleque de Um Grande Garoto (2002) e não deixa de ser interessante que ele tenha alguns duelos com Toni Collette, a atriz que interpretava sua mãe naquele filme. Ambos estão competentes em cena e ajudam o diretor a conduzir a narrativa de forma pouco óbvia. Embora não seja inesquecível, cumpre o que promete e faz a plateia pensar um pouco mais sobre seus conceitos de justiça e impunidade. Falando em justiça é estranho que a Warner tenha jogado o filme de qualquer jeito nos cinemas dos EUA antes de colocar direto no streaming por aqui (está em cartaz no Max). Após tantos anos de serviços prestados de Clint à história do cinema. Filmando aos 94 anos, este pode ser o último filme do astro e considero que ele merecia um pouco mais de respeito. 

Jurado nº2 (Juror #2 /  EUA - 2024) de Clint Eastwood com Nicholas Hoult, Toni Collette, Zoey Deutch, Chris Messina, Gabriel Basso, J.K. Simons, Kiefer Sutherland, Leslie Bibb, Drew Scheid e Adrienne C. Moore. ☻☻☻

domingo, 22 de dezembro de 2024

10+ Melhores Filmes Lançados em 2024

Aquecendo as listas para a chegada dos meus favoritos do ano cinematográfico de 2024, fiz a lista dos dez filmes lançados no Brasil ao longo do ano de que mais gostei. Foi um ano fraco (e com vários fracassos e decepções) se compararmos com 2023 (provavelmente reflexo da greve dos roteiristas que afetou diretamente a grade de produção e lançamentos) e enquanto muitos filmes da atual temporada de ouro não aparecem por aqui, alguns filmes da temporada de premiações do início do ano garantiram seu lugar no top10. Minha lista inicial tinha dezoito filmes e precisei refinar alguns critérios para chegar aos que aparecem por aqui em ordem alfabética: 

"Ainda Estou Aqui" de Walter Salles 

 "Anatomia de Uma Queda" de Justine Triet


quinta-feira, 19 de dezembro de 2024

PL►Y: Sem Relação

Anna e Tom: Loki em sua estreia no cinema. 

A inglesa Joanna Hogg trabalha desde o final dos anos 1980, na década seguinte se dedicou a trabalhos para a televisão até se aventurar nos anos 2000 por um cinema mais autoral. Embora muita gente tenha conhecido seu trabalho quando The Souvenir (2019) caiu nas graças da crítica, e figurou em algumas listas de melhores do ano (tanto que o filme gerou uma sequência em 2021), Joanna estreou na telona com este Unrelated, um filme que fala sobre sentimentos complicados de uma mulher madura de quarenta anos.  A história acontece em alguns dias de férias em que Anna (Kathryn Worth) é convidada por uma amiga, Verena (Mary Roscoe), a passar alguns dias com ela em uma casa de campo na Itália, mais precisamente na Toscana. Enquanto Verena está ao lado do esposo (Michael Hadley), dos filhos, Archie (Harry Kershaw), Jack (Henry Lloyd-Hughes), Oakley (Tom Hiddleston) e Badge (Emma Hidleston) e mais um casal de amigos, à Anna cabe ter algumas conversas atravessadas com o esposo por telefone. Se por um lado Anna está muito calada, nas conversas ao telefone vemos que seu casamento não anda muito bem. O curioso é que esta sensação de um casamento ruindo lhe causa certo afastamento dos outros casais presentes na casa, mas gera uma certa proximidade com os filhos da amiga, especialmente com Oakley. Tanto este descolamento das pessoa maduras e a aproximação com o descompromisso da juventude estão marcadas nas entrelinhas do filme, já que Hogg é uma diretora que não gosta de ser explícita no que apresenta, prefere deixar que as cenas aconteçam de forma mais espontânea, quase improvisada como se não houvesse um roteiro, pelo menos até que um dilema se instaure. O dilema aqui está na atração que Anna começa a nutrir pelo charmoso primogênito da amiga, Oakley. Vale destacar um mérito inquestionável de Joanna Hogg, ela foi a primeira pessoa a confiar no apelo que Tom Hiddleston poderia ter  no cinema. Conhecido hoje por sua antológica performance como Loki, o deus da Mentira da Marvel, até então o ator estava restrito a papéis em programas de televisão sem muito destaque. Foi Hogg que percebeu como o ator poderia ser o objeto de desejo que a vida apática de sua protagonista precisava. Quando os dois estão juntos em cena, você pode sentir as faíscas entre os dois em uma narrativa que segue em uma ambientação morna, com uma paisagem bem mais (árida) e realista do que a que costumamos em ver em filmes sobre pessoas em férias paradisíacas. Talvez esta opção seja para dizer que ali não é o paraíso e tanto os conflitos entre Oakley com o pai, um acidente de carro e um amargo gosto de rejeição irão pairar a partir da metade do filme. Apesar do marasmo narrativo da primeira parte, Sem Relação se torna mais interessante conforme torna a viagem de seus personagens mais desconfortável, tão desconfortável quanto à realidade de Anna que precisa colocar os pés no chão e enfrentar uma realidade não desejada em sua volta para casa. A produção mostra-se então uma boa carta de apresentação de uma cineasta que possui um olhar sutil para fazer filmes sobre pessoas com histórias comuns e seus sentimentos complicados. 

Sem Relação (Unrelated / Reino Unido - 2008) de Joanna Hogg com Kathryn Worth, Tom Hiddleston, Mary Roscoe, Michael Hadley, Henry Lloyd Hughes, Harry Kershaw e Emma Hiddelston. ☻☻

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

4EVER: Marisa Paredes

03 de abril de 194612 de dezembro de 2024

María Luisa Paredes Bartolomé nasceu em Madrid e ao longo de sua carreira se consolidou como uma das grandes damas do cinema espanhol. Atuando desde os 14 anos de idade, a artista foi aclamada em vários momentos de sua carreira. Presença no cinema espanhol desde 1960, sua carreira ganhou apelo mundial a partir de sua primeira colaboração com o cineasta Pedro Almodóvar com o filme Maus Hábitos (1983), desde então se tornou uma das musas do cineasta, com quem trabalhou novamente em De Salto Alto/1991 (pelo qual foi premiada como melhor atriz no Festival de Gramado), A Flor do Meu Segredo/1995, Tudo Sobre Minha Mãe/1999, Fale Com Ela/2002 e A Pele que Habito/2011. Com presença marcante em mais de cem produções, entre os anos 2000 e 2003, Paredes presidiu a Academia Espanhola de Cinema e em 2018 recebeu o Prêmio Goya pelo conjunto da carreira. O último trabalho da atriz é o longa-metragem Saída de Emergência que encontra-se em pós-produção. Marisa faleceu após uma internação por problemas arteriais.

PL►Y: Longlegs

Maika: um serial killer das trevas.

Pode se dizer que entre todos os filmes que foram lançados durante o ano, o terror Longlegs se tornou o sucesso mais surpreendente do ano. Muito se deve à aura de mistério construída em torno do marketing em que nada era revelado sobre a trama. Tudo o que circulava era que se tratava de uma investigação sobre uma série de crimes mal resolvidos e, depois que o filme estreou, começaram a falar muito sobre a presença e Nicolas Cage em mais um daqueles trabalhos que só funcionariam se fosse feito por ele. Houve um hype tão grande em torno do filme que logo rendeu dez vezes o seu orçamento nas bilheterias mundiais (custou cerca de dez milhões de dólares, uma ninharia para os padrões de Hollywood). A plateia carente de um suspense envolvente e saturada de ideias recicladas, caiu de amores pelo filme de atmosfera estranha em torno de uma trama macabra que flerta com o fantástico em contraste com sua aparência realista. O responsável por conciliar este contraste complicado é Osgood Perkins (ou Oz Perkins para os íntimos), o filho de Anthony Perkins (ele mesmo, o próprio ator do clássico Psicose/1960). Até aqui, Oz era mais conhecido por ser uma figura dissonante em Hollywood, principalmente por curtir fazer filmes de terror mas não assiste os sucessos recentes do gênero - o que lhe garante uma estética bastante peculiar, distante do que está na moda. O moço trabalha como ator desde 1982, quando fez a versão mirim de seu pai em Psicose2 (1983) quando tinha apenas nove anos de idade. Desde então já participou de tudo quanto é tipo de séries e filmes, de Legalmente Loira (2001) até Star Trek (2009), mas aquele sujeito grandalhão e meio deslocado chamou atenção mesmo quando dirigiu seu primeiro filme, Enviada do Mal (2015), também conhecido como February ou The Blackcoat's Daughter. O filme (que visto hoje parece a versão diabólica do recente Os Rejeitados/2023) causou estranhamento assim que estreou e obteve relançamentos por conta de não saberem exatamente como vender o filme. Passado outros dois filmes sem muito sucesso, Osgood finalmente conseguiu construir uma história capaz de se comunicar com um público mais amplo, embora, muito de sua estreia para lá de sombria tenha semelhanças com a atmosfera construída por aqui. O filme acompanha Lee (Maika Monroe), uma novata agente do FBI que costuma ter intuições certeiras. Por conta de sua sensibilidade aguçada, ela é escolhida para auxiliar a desvendar uma série de crimes envolvendo famílias até então tranquilas. Ao que tudo indica, o pai da família é o responsável pelas atrocidades antes de tirar a própria vida. No entanto, no local dos crimes é deixada uma carta com códigos indecifráveis assinadas por Longlegs. Para não comprometer as surpresas, basta dizer que Lee irá começar a desvendar as entrelinhas dos crimes e se deparar com detalhes cada vez mais estranhos e alguns segredos que ela preferia não ter descoberto. É um filme de investigação carregado na rédea curta pelo diretor e que gerou comparações com o incomparável O Silêncio dos Inocentes (1991) pela forma como em boa parte das cenas, mais sugere do que mostra. Perkins constrói meticulosamente um verdadeiro universo em que tudo é incerto e o mal está sempre à espreita com as artimanhas mais cruéis. Transitando por tudo isso está um elenco perfeito, Maika Monroe está ótima como uma protagonista que também pode ser classificada como estranha (e perceba como ela muda de postura quando está "liberta" de sua própria maldição), a atriz realiza um trabalho sutil, que transpira desconforto a maior parte do tempo. Ela é seguida de perto pelo "chefe" Blair Underwood e da "mãe" Alicia Witt. Obviamente que em outro nível está Nicolas Cage, que deixa pairar sobre o filme um estranhamento ainda maior com as sandices que saem de sua boca em aparência grotesca. Fazia tempo que eu não assistia um filme em que não fazia a mínima ideia do que estava acontecendo e que me deixasse tão apreensivo diante do que via. Para piorar, Oz se inspirou em um crime real sem solução para criar o filme e, ao conhecer a história verídica, tive a impressão que o cineasta lidou com seus próprios temores sobre o caso ao criar o roteiro. No fim das contas, o resultado é tão trevoso que o diretor faz a gentileza de deixar um gesto (visivelmente improvisado por Cage) para lembrar à plateia que é tudo é uma fantasia (embora seja das mais assustadoras). 

Longlegs: Vínculo Mortal (EUA - 2024) de Osgood Perkins com Maika Monroe, Blair Underwood, Alicia Witt, Michelle Choi-Lee e Dakota Daulby. ☻☻☻

domingo, 15 de dezembro de 2024

PL►Y: MaXXXine

Mia e Tabby Martin: a hora do pastiche.

Nos início de 2022, quando o cinema ainda tentava se recuperar da pandemia, a A24 lançou um filme de terror sem muito estardalhaço. Chamado apenas de X (e aqui recebendo o aposto A Marca da Morte), o longa contava a história de uma equipe responsável pelas gravações de um filme pornográfico dos anos 1970 que resolveu fazer locações em uma fazenda. Os donos da fazenda, eram idosos aparentemente inofensivos até que... começa a carnificina. Com referência nos slasher movies do período, o diretor Ti West chamou atenção de público e crítica pela criatividade com um filme que poderia ter sido mais do mesmo. A ideia deu tão certo que gerou uma sequência lançada no mesmo ano, Pearl (2022), ainda mais interessante ao centrar a narrativa na juventude de insana senhora Pearl Douglas, a velhinha dona da tal fazenda. Em ambos os filmes, ainda que em tempos diferentes, a idosa é interpretada magistralmente por Mia Goth, que alcançou status de estrela e ajudou West a dar forma ao roteiro da sequência, que se tornou um longa ainda mais robusto com referências aos clássicos do cinema. Vale lembrar que em X, Mia também era responsável por viver Maxine Minx, uma jovem estrela pornô que se tornava objeto de desejo de Pearl. Agora é Maxine que ganha um filme para chamar de seu, desta vez ambientado nos anos 1980 e que flerta com a atmosfera dos filmes policiais centrados na perseguição a um serial killer tão comuns no período. Maxine ainda vive atormentada pelos acontecimentos chocantes do primeiro filme, mas deseja largar o ramo de filmes para maiores e se tornar uma atriz respeitável em Hollywood. Obviamente que ela terá que superar  todo o conservadorismo (e a hipocrisia) que varreu os EUA durante os anos 1980 se quiser mudar de vida. Sorte que além de esperta, a jovem tem o talento dramático necessário para ser escolhida como protagonista de uma sequência de um sucesso do terror: A Puritana 2. Só que nada será fácil na vida da moça, já que alguém a persegue misteriosamente a acusando de ter cometido os assassinatos na fazenda na década passada enquanto a cidade vive atormentada com a presença de um serial killer. Mais uma vez Ti West investe na construção de uma atmosfera diferenciada pautado em uma referência temporal do horror para contar sua história, mas aqui ele precisa lidar com duas situações involuntárias: a primeira é toda aceitação que Pearl recebeu e que, as várias referências do terror dos anos 1980, fazem o filme ficar cada vez mais próximo do pastiche de um filme Z. Esta sensação acontece quase o tempo todo, especialmente quando entra em cena os policiais vividos por Michelle Monaghan e Bobby Canavalle (este mais canastra do que nunca), o detetive vivido por Kevin Bacon e até o grande vilão da história em seu ato final (que eu já imaginava quem era desde que a sinopse do filme foi anunciada, basta lembrar daquelas cenas finas de X). Tudo é exagerado e um pouco tonto por aqui, o que desperdiça toda a reconstituição de época cuidadosa, seja na fotografia granulada, nas cores, na trilha sonora ou no figurino. Ironicamente, é a primeira vez que Ti trabalha com tantos nomes conhecidos de Hollywood (ainda conta com Giancarlo Esposito, Lily Collins e Elizabeth Debicki), mas ninguém tem muito o que fazer em cena. Abandonando o foco que fazia os filmes anteriores serem tão eficientes, MaXXXine atira para todos os lados e acaba deixando até o filme dentro do filme de lado. Não por acaso o longa desagradou os fãs da franquia que notaram que o texto oferece menos à Mia Goth do que os filmes anteriores. Ouvi alguns comentários de que West tem ideias para outros filmes dentro deste universo, mas não sei se é uma boa ideia, melhor parar por aqui. 

MaXXXine (EUA- 2024) de Ti West com Mia Goth, Giancarlo Esposito, Kevin Bacon, Elizabeth Debicki, Bobby Cannavale, Michelle Monaghan, Lilly Collins, Sophie Thatcher, Moses Sumney e Simon Prest.

FILMED+: Os Rapazes da Banda.

O elenco: do teatro para as telonas.
 
Em 2020 a Netflix bancou uma versão em filme da peça The Boys in The Band de Matt Crowley lançada originalmente em 1968 e, somente após escrever meus comentários sobre o filme dirigido por Joe Mantello, descobri que havia uma outra versão, lançada em 1970 por William Friedkin. A peça se tornou um marco temporal ao se tornar a primeira com personagens homossexuais em destaque a se tornar um grande sucesso nos palcos. O sucesso foi tanto que choveram propostas a Crowley para uma adaptação cinematográfica. Ele recusou muitas por conta de um ponto que ele não abria mão: manter o elenco do teatro na versão cinematográfica e o diretor também (ideia da qual acabou abrindo mão). Quando aceitou que um grande estúdio bancasse o filme, Crowley foi convencido de que Friedkin seria um bom nome para a versão. O cineasta estava prestes a se tornar um grande nome do cinema (seu filme seguinte, Operação França/1971 foi indicado a oito Oscars, levando cinco para casa, incluindo filme e direção) e causou estranhamento no elenco quando insistiu para que ensaiassem seus papeis após um ano de sucesso nos palcos. Esta preocupação com a transposição para o cinema reflete-se na tela, já que Friedkin cuida minuciosamente dos detalhes das interpretações mais sutis, usa vários movimentos de câmera, capricha na montagem, nos planos, nos enquadramentos e closes. O resultado tem nada de teatro filmado, pelo contrário, mostra-se profundamente cinematográfico e real no tom cru que imprime ao grupo de amigos homossexuais que  se reúne na casa de um deles para comemorar um aniversário. O anfitrião é Michael (Kenneth Nelson), que vive um relacionamento com Donald (Frederick Combs), os dois estão naquela fase em que o passo adiante teima em não acontecer. O ótimo Kenneth Nelson dá conta de um personagem bastante complexo, já que o tempera uma essência amarga que se evidencia cada vez mais em sua relação com os demais convidados. Fazem parte da comemoração o casal Hank (Laurence Luckinbill) e Larry (Keith Prentice), o exagerado Emory (Cliff Gorman) e o discreto Bernard (Reuben Green), o único negro do grupo. Quem também participa da festa é Cowboy (Robert La Torneaux), um garoto de programa contratado para ser presente do aniversariante. Em contraponto existe Alan (Peter White), o ex-colega de quarto hétero de Michael que está de passagem por Nova York e resolve fazer uma visita no dia da festa. O  misterioso aniversariante é Harold (Leonard Frey), que recebe uma entrada triunfal em cena, já que é peça fundamental para fazer Michael repensar sua postura diante da vida. Os personagens se mostram uma coleção de arquétipos gays do período e, não por acaso, o encontro começa alegre, mas aos poucos o clima pesa com as conversas e alguns ressentimentos que começam a vir à tona baseado na trajetória de cada um. Impressiona o fato de como o texto ainda permanecesse atual e como a estética adotada por Friedkin soa mais realista do que a versão de 2020, como se fosse realmente um recorte de um momento daquelas vidas. Obviamente que o filme se beneficia muito da familiaridade que cada ator tem com seu personagem, isso faz toda a diferença naquela brincadeira do telefone (que aqui funciona muito melhor do que na refilmagem), com destaque para Peter White que sempre deixa um mistério constante sobre a sexualidade do personagem. Obviamente que, perante o conservadorismo da época, o filme não chamou atenção nas bilheterias e passou em branco nas premiações, o que não impediu que o tempo o tornasse um marco do cinema queer. Falecido no ano passado, Friedkin foi um dos grandes nomes responsáveis pela reinvenção de Hollywood entre meados dos anos 1960 e ao longo dos anos 1970. Responsável ainda pelo clássico O Exorcista (1973), o diretor também merecia maior reconhecimento por trabalhos mais recentes como Possuídos (2006) e Killer Joe (2011), mas ouso dizer que Os Rapazes da Banda está entre seus trabalhos mais notáveis, especialmente pela ousadia de conduzir um filme com esta temática em um tempo que a palavra gay era quase proibida no mainstream (e ele repetiu a proeza despertando ainda mais polêmica dez anos depois com Parceiros da Noite/1980). Vale dizer que a própria história do elenco, após o sucesso da peça, merecia outro filme. Composto em sua maioria por homossexuais, suas vidas representam muito os percalços da comunidade gay do período. Seja por preconceitos, ofertas de trabalho, dos romances secretos com celebridades, estigmas ou o advento da AIDS que vitimou alguns dos atores que vemos magistrais nesta produção.   
 
Os Rapazes da Banda (The Boys in the Band/ EUA - 1970) de William Friedkin com Kenneth Nelson, Leonard Frey, Peter White, Cliff Gorman, Reuben Green, Robert La Torneaux, Laurence Luckinbill, Keith Prentice e Reuben Green. ☻☻☻☻

PL►Y: A Garota da Vez

Kendrick: estreia promissora na direção. 
 
Anna Kendrick começou sua carreira no cinema aos dezoito anos sabendo utilizar sua aparência de amiga da vizinhança, foi muito por conta disso que ela chamou atenção de algumas pessoas como a amiga de Bella na saga Crepúsculo (2008). Quando quis demonstrar que era capaz de ser mais do que uma garota comum, ela foi indicada ao Oscar pelo trabalho em Amor Sem Escalas (2009) em que vivia a aprendiz especialista em demitir pessoas em reformas corporativas. Desde então Anna já trabalhou em diversos filmes, alguns fizeram sucesso, outros nem tanto, mas ela percebeu que estava na hora de dar um passo diferente na carreira. A Garota da Vez marca a estreia da atriz como cineasta e, embora o filme tenha seus tropeços, podemos afirmar que é um trabalho bastante promissor. A começar pela coragem de construir o filme com base em uma sinistra história real: a participação de um serial killer em um programa de namoro na TV. Parece absurdo, mas é um daqueles casos em que se fosse ficção você acharia que é algo inacreditável de acontecer, mas aconteceu de verdade. Além de dirigir, Anna vive Cheryl Bradshaw, uma jovem atriz que está cansada de ser recusada em testes. Como as contas não esperam, ela aceita a ideia de participar de um programa chamado The Dating Game em que uma garota faz perguntas para três candidatos (que ficam escondidos até o final do programa) afim de escolher um deles para uma viagem romântica. Entre os candidatos está Rodney Alcala (Daniel Zovatto que consegue trabalhar), um rapaz capaz de dar as respostas certas às perguntas como o disfarce perfeito para sua personalidade assassina - e, infelizmente, desde a primeira cena do filme, sabemos do que Rodney é capaz (e vale ressaltar que Daniel Zovatto realiza um bom trabalho, imprimindo sempre um ar sinistro às atitudes mais afáveis do personagem). Trabalhando como fotógrafo e sabendo o que dizer para ganhar a confiança e seduzir suas vítimas estima-se que ao todo ele tenha assassinado mais de cem pessoas. A montagem do filme mescla sua participação no programa com as atrocidades cometidas por ele e esta opção narrativa demonstra ser um dos pontos mais problemáticos do filme, já que torna-se bastante cansativas as cenas de violência ao longo de todo o filme - embora a diretora saiba trabalhar bastante com o poder da sugestão o que pode deixar a coisa ainda mais perturbadora. Kendrick também acerta no tom de tensão quando o programa termina e um inevitável encontro acontece para que Cheryl perceba que fez a escolha mais errada entre os candidatos do programa. Gosto muito da cena em que o plano aberto representa a sensação de medo e vulnerabilidade enquanto Cheryl tenta fugir, momento que considero o ponto alto do filme. O roteiro também tece algumas críticas pela forma tola e machista com que as candidatas do programa precisavam ser representadas diante da câmera, além da falta de critério para a escalação dos rapazes que participavam do programa, basta lembrar que o serial killer realmente participou do programa em 1978, mesmo com histórico de passagens pela polícia. Seu primeiro registro problemático foi aos 17 anos, por má conduta sexual e colapso nervoso enquanto servia ao exército, depois foi preso por 34 meses por conta de... cenas parecidas com a que vemos no filme. O número de vítimas de Rodney Alcala é extenso e Cheryl não fazia ideia do risco que correu ao aceitar participar do tal programa. Faz pouco tempo que o filme esteve em cartaz nos cinemas e já está disponível no Prime Video.

 A Garota da Vez (Woman of the Hour / EUA - 2023) de Anna Kendrick com Anna Kendrick,  Daniel Zovatto, Tony Hale, Nicolette Robinson, Pete Holmes, Matt Viser e Dylan Schmid. ☻☻

sábado, 14 de dezembro de 2024

10+ Filmes procurados no Blog em 2024

Ano passado inaugurei uma nova modalidade de lista por aqui, a relacionada aos textos postados durante o ano que mais chamaram atenção dos leitores. Assim como em 2023, tive gratas surpresas, a começar pelo pódio sem produções Made in Hollywood e liderado por um filme brasileiro (e não é aquele que você está pensando)! Temos ainda o primeiro filme de um diretor badalado, uma animação (que também não é a que você imagina), um clássico queer, um fracasso de bilheteria, uma das ousadias da temporada passada, um cult norueguês, o longa mais sem graça indicado ao último Oscar, um filme francês sem destaque nos cinemas e um terror underground (que não é o que você pensou).

Prontos para a lista mais surpreendente do blog?



 
 
 
 
 
 
 

PL►Y: Blitz

Soirse e Hefferman: separados pela guerra.

Havia bastante burburinho de que a irlandesa Saoirse Ronan entraria para o seleto clube das atrizes que são indicadas duplamente em uma cerimônia do Oscar. Motivos para isso são seus trabalhos em The Outrun (que lhe rendeu indicações ao British Independent e Gotham Awards) e neste Blitz, novo filme do badalado Steve McQueen. O contraste entre as duas personagens também ajudaria bastante a atriz, já que no primeiro ela vive uma mulher problemática e no segundo uma mãe separada do filho em meio à Segunda Guerra Mundial. Se a indicação sair (o que parece cada vez mais difícil com o congestionamento de interpretações femininas marcantes no ano), provavelmente ela não será por Blitz, que foi recebido com frieza por crítica e público que esperava um pouco mais do encontro do diretor do oscarizado 12 Anos de Escravidão (2013) com a atriz já indicada quatro vezes ao Oscar (nada mal para quem acaba de completar trinta anos). A recepção fria ao filme, que era a grande aposta da AppleTV para os prêmios deste ano, se deve principalmente a trama sem graça que é apresentada. Ambientado durante os bombardeios em  Londres, havia um programa de proteção para deixar crianças a salvo dos bombardeios na capital da Inglaterra. Para mantê-las em segurança, as mães as enviam para o campo até que um dos momentos mais críticos da guerra passasse. Para proteger o filho, George (Elliot Heffernan), a operária Rita (Saoirse Ronan) o envia de trem para o campo, mas o menino preferia ficar ao lado dela naquele momento difícil - tanto que a despedida entre os dois tem sabor de revolta. O menino resolve fugir do trem e voltar para casa, o que o coloca em situações perigosas em meio ao cenário de guerra. Ele acaba encontrando um grupo de outros meninos fugitivos, é protegido por um guarda de bom coração, se envolve com saqueadores, com as inundações do metrô e bombardeios. É estranho que enquanto o filme acompanha as desventuras do menino, deixa a sensação de que não sabe o que fazer com Rita para preencher seu tempo de tela, pelo menos até que ela descubra que o filho fugiu e siga fazendo nada de relevante no filme. Ainda que Saoirse seja uma ótima atriz, ela não consegue fazer milagre com uma personagem tão sem graça. Havia uma campanha para que o novato Elliot Hefferman concorresse ao Oscar de melhor ator, mas a situação do garoto complica ainda mais já que na maioria das vezes seu personagem é mais uma testemunha dos acontecimentos do que protagonista da narrativa. A fotografia em tons de marrom também não ajuda a prender a atenção em uma narrativa esquemática que ambicionava traçar um panorama daquele período. Falta vigor na trama e o verniz antirracista do filme também não consegue sair do lugar comum. Muitos já apontam o longa como o filme mais decepcionante de McQueen. Difícil imaginar que Blitz foi realizado pelo diretor indie que começou a carreira chamando atenção com os incomuns Fome (2008) e Shame (2011), aqui falta a assinatura do diretor que pode fazer muito mais do que vemos aqui. Existem bons momentos, mas são poucos se pensarmos nas ambições da produção. Por vezes tive a impressão que o longa se torna a versão aguada do tcheco O Pássaro Pintado (2019). Longe de mim querer que o George sofresse feito o pequeno Joska, mas custava fazer de Blitz um filme menos redundante?

Blitz (Reino Unido - EUA / 2024) de Steve McQueen com Saoirse Ronan, Elliot Hefferman, Harris Dickinson, Benajmin Clémentine, Paul Weller e Stephen Graham.

PL►Y: Coringa - Folie a Deux

Gaga e Phoenix: o filme mais odiado do ano.

Se  Coringa2 não for o maior fracasso de bilheteria de 2024, ele com certeza merece o título de filme mais odiado do ano. Muito por conta do fenômeno cultural que foi o primeiro filme (um filme baseado em HQ que foi Premiado no Festival de Veneza e rompeu a barreira do bilhão nas bilheterias com um drama sombrio e pessimista). O primeiro Coringa fez tanto sucesso que rendeu todos os prêmios daquela temporada para o colosso Joaquin Phoenix e levou ainda o Oscar de trilha sonora enquanto disputava outras nove categorias no maior prêmio do cinema americano - incluindo filme e direção para Todd Phillips. Ao que parece todo mundo gostou do sucesso de Coringa, menos o diretor. Phillips ficou famoso com a comédia Se Beber Não Case (2009) e disse em entrevistas ter feito seu Joker pensando em como dar risada pode ser considerado ofensivo nos dias atuais. Acontece que a interpretação que muita gente teve de seu vilão foi diferente do que ele imaginava e viu o personage ser considerado por muitos um herói incompreendido num mundo excludente - por mais que Phillips ressaltasse que seu protagonista era um assassino perigoso. Assim como Joker se tornou uma figura cultuada na trama por conta dos crimes que cometeu, o cineasta viu o mesmo acontecer na vida real. Diante do sucesso inesperado do primeiro filme, Todd foi convidado a realizar uma inevitável sequência, mas disse que faria apenas se fosse do seu jeito, sem que os produtores se metessem. Foi assim que ele torrou quatro vezes mais para desconstruir tudo o que muita gente venera no filme anterior. Pista de que isso aconteceria aconteceu quando divulgou que seria um musical e que teria Lady Gaga como a mítica Arlequina. Devo dizer que nenhum desses pontos me desagradou, ainda que os considerasse um bocado arriscados. Pista porque o musical deve ser o gênero menos apreciado ao redor do mundo, mas ainda assim temos ao menos um exemplo brilhante de como podem ser sombrios e assustadores (Sweeney Todd/2007 de Tim Burton, filme que eu adoro), por outro lado, por mais que Lady Gaga seja uma atriz competente, seu fã-clube é proporcional ao número de haters de olho em tudo o que ela faz. No fim das contas, tudo dependeria do roteiro assinado pelo diretor e Scott Silver. A bomba já se denunciava no Festival de Veneza em que o filme era um dos mais aguardados e recebeu críticas mornas. Aqui, Arthur Fleck (Phoenix) está internado no Asilo Arkham aguardando julgamento pelos cinco assassinatos que cometeu. Medicado, calado e controlado, ele mal faz ideia que fora dali tem uma legião de seguidores enquanto serve de chacota para os guardas do local. As coisas parecem melhorar quando ele conhece Harley Quinzel, mais conhecida como Lee (Lady Gaga), que idolatra a imagem insana daquele sujeito e o motiva a ser novamente o imprevisível Coringa. Aos poucos, Fleck volta a encarnar seu alterego e o filme segue em um julgamento que revisita situações e personagens do filme anterior. Com isso Folie a Deux (nome em francês para transtorno delirante induzido) se torna dependente demais do primeiro longa, com uma série de explicações que ninguém pediu. O filme se torna repetitivo em um roteiro que anda em círculos para terminar de forma bastante decepcionante. Todo o teor robusto de Joker não aparece aqui. A culpa nem é das músicas (logo no início o diretor já anuncia sua proposta em um programa de TV: quer provar como o musical pode servir ao drama dos personagens), também não me incomoda o fato de Joaquin não cantar bemm o que incomoda é que para um filme com mais de duas horas, o roteiro soa improvisado, com ideias inventivas que não foram bem desenvolvidas. Meu momento favorito do filme é aquele em que Puddles (Leigh Gill, perfeito!) vai depor e expõe todo horror de perceber que um amigo se transformou em um monstro (ou será que ele sempre foi?). Esta é a intenção de Todd Phillips, mostrar que o vilanesco Coringa não é digno de admiração e acho que este é o grande motivo de ódio perante o filme. De certa forma, ao ver Coringa2 a plateia sente-se tão decepcionada quanto Lee (e Lady Gaga que aparece pouco e subaproveitada com o potencial da personagem) e restou apenas reclamar do filme, que está longe de ser um desastre, mas também não é tão interessante quanto poderia ter sido. Acho que, no fundo, faltou ao diretor a ousadia de radicalizar suas ideias (algo que vimos recentemente em A Substância), distante de toda emulação scorsesiana, Todd deixou o filmeem cima do muro. Resta apenas apelar para o fanservice do desfecho para que se criem teorias a respeito do que acontece depois. Que aconteça nada, por favor. 

Coringa: Folie a Deux (EUA-2024) de Todd Phillips com Joaquin Phoenix, Lady Gaga, Brendan Gleeson, Catherine Keener, Zazie Beetz, Leigh Gill, Harry Lawtey e Steve Coogan.