sexta-feira, 31 de janeiro de 2025

HIGH FI✌E: Dezembro2024/Janeiro2025

 Cinco filmes assistidos nos últimos meses que merecem destaque: 








KLÁSSIQO: Veludo Azul

Kyle e Isabella: quando sonho e pesadelo são universos em colisão.

 David Lynch tentava se recuperar do trauma que foi realizar a (primeira) versão cinematográfica de Duna (1984) para Dino de Laurentis após a aclamação por O Homem Elefante (1980). Se o seu segundo longa rendeu oito indicações ao Oscar, Duna só rendeu dores de cabeça e se tornou um filme (feito por encomenda) que o cineasta renega até hoje. Estava na hora de colocar novamente a carreira nos eixos e isso aconteceu com Veludo Azul, uma obra que se tornou um marco no estilo que o diretor adotaria dali em diante. Estão presentes as mudanças atmosféricas durante a narrativa, a mistura de sonho com pesadelos, além daquele jeitão que transpira um cinema clássico que está ali para ser virado do avesso. Desde o início, Lynch apresenta seus cenários como se fossem feitos de pura perfeição suburbana. Uma tranquilidade absoluta que é logo abalada com um personagem que é hospitalizado e, debaixo de toda aquela perfeição vemos um amontoado de besouros agitados digladiando. Este é o ponto de partida para a chegada de Jeffrey Beaumont (Kyle MacLahclan), um jovem  que volta para a terra natal para cuidar da loja do pai. Eis que de volta ao lugar tão familiar e confortável, Jeffrey encontra uma orelha humana no gramado! Intrigado com aquela situação, ele procura a polícia e acaba se envolvendo com Sandy (Laura Dern), filha do detetive de polícia. Embora seja doce e comportada, Sandy sabe mais do que o pai imagina sobre o caso e acaba favorecendo o encontro do curioso Jeffrey com a bela Dorothy Valens (Isabella Rossellini), cantora de uma casa noturna que sofre um drama familiar por conta dos bandidos que a perseguem. Isso é o suficiente para que Lynch faça dois universos completamente diferentes colidirem. Se Jeffrey e Laura parecem pertencer a um filme clássico tradicional de romance entre jovens estudantes (e a aparência do casal colabora muito para isso, basta ver como Kyle tem a estampa de um galã das antigas e como Laura transpira a ingenuidade de uma mocinha clássica do cinema, ideia ampliada ainda mais por sua primeira banhada de luz), por outro lado, Dorothy habita o submundo, repleto de crimes e violência, mas não importa o que ela faça, ela parece estar presa naquele universo como se estivesse enclausurada em um pesadelo. Vale a pena dizer que Isabella (namorada de Lynch na época) solta faíscas na tela desde a primeira cena em que canta a faixa título (Blue Velvet que foi regravada até pela Lana Del Rey e gerou um clipe cheio de referência ao universo Lynchiano) e recebeu o prêmio de melhor atriz no Independent Spirit Awards. Sua presença banha o filme com uma aura incomum de sensualidade e vulnerabilidade, o que se beneficia ainda mais com a química potente apresentada ao lado de Kyle MacLachlan (que depois do mico de protagonizar Duna se firmou ao longo do tempo como muso de Lynch, estrelando as temporadas de Twin Peaks e outros projetos do cineasta). Em contrapartida ao triângulo amoroso apresentado, o filme conta com Dennis Hopper encarnando o bizarro Frank Booth, responsável pelas maiores atrocidades d. Quase quarenta anos após seu lançamento, Veludo Azul ainda chama atenção pela forma fluente com que trafega entre os gêneros cinematográficos e como sua aura de mistério é milimetricamente construída entre a beleza e a estranheza. Não por acaso, Lynch foi indicado ao Oscar de Melhor direção pelo seu trabalho, única categoria em que o o filme foi celebrado pela academia. 

Veludo Azul (Blue Velvet /  EUA - 1986) de David Lynch com Kyle MacLachlan, Isabella Rossellini, Laura Dern, Dennis Hopper e Dean Stockwell. 

quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

4EVER: Marianne Faithfull

29 de dezembro de 1946 ✰ 30 de janeiro de 2025

Nascida em Hampstead, Londres, Marianne Evelyn Gabriel Faithfull era filha de uma baronesa austríaca e um professor de psicologia militar britânico. Em 1964 ela foi descoberta pelo produtor Andrew Loog Oldham e logo depois lançou sua primeira música "As Tears Go By", uma canção escrita por Oldham, Mick Jagger e Keith Richards. A música se tornou um dos primeiros sucessos dos Rolling Stones e projetou a carreira da jovem cantora. Bela e magnética, ela se tornou musa de fotógrafos, estilistas e músicos, colaborando com artistas do porte de David Bowie, Lou Reed Leonard Cohen, PJ Harvey e Nick Cave. A artista se tornou uma referência para a música, especialmente após o lançamento de seu álbum Broken English em que se reinventou com elementos de punk e new wave. Marianne falava abertamente dos problemas de uma vida de excessos e de muito trabalho. Ao longo da carreira lançou cerca de 30 álbuns e participou de dezenas de filmes, entre eles Hamlet (1969), Intimidade (2001), Paris Eu te Amo (2006), Maria Antonieta (2007) e Duna (2021). Nos últimos anos, a artista precisou lidar com as consequências da COVID19, o que não impediu que fizesse participações especiais em programas de TV. Ícone da contracultura, a artista faleceu pacificamente em companhia da família. 

terça-feira, 28 de janeiro de 2025

4EVER: Marina Colasanti

26 de setembro de 193728 de janeiro de 2025

Marina Colasanti nasceu em Asmara na Eritreia, três anos depois sua família se mudou para a Itália, onde presenciaram os últimos anos da Segunda Guerra Mundial. Em 1948 a família resolveu vir para o Brasil, se instalando na cidade do Rio de Janeiro. Entre 1952 e 1956, ela estudou na Escola Nacional de Belas Artes e Começou a trabalhar no Jornal do Brasil em 1962. Na publicação se tornou redatora, cronista e editora, mas o lançamento do primeiro livro só veio em 1968, intitulado "Eu Sozinha". Em 1974 apresentou o noticiário Primeira Mão da TV Rio, depois trabalhou na TVE e nas revistas Nova e Manchete. Marina se tornou uma referência na literatura brasileira, lançou mais de 70 livros (muitos voltados para o público infanto-juvenil) e recebeu vários prêmios ao longo de sua carreira. Famosa por seus textos com protagonismo feminino e elementos fantásticos, a causa de sua morte não foi divulgada.

domingo, 26 de janeiro de 2025

PL►Y: Canina

Amy e os caninos: o desperdício de uma ideia promissora. 

Amy Adams é uma ótima atriz e com o passar do tempo virou um daqueles casos em que se acumula várias indicações ao Oscar e nenhuma estatueta, fato que só acrescenta a qualquer novo projeto que embarca aquela sensação de "será que agora vai?". Isso aconteceu com Canina assim que a diretora Marielle Heller divulgou que Amy seria a protagonista da adaptação do livro de Rachel Yoder para o cinema. A trama curiosa é cheia de possibilidades, já que conta a história de uma mulher que após ter seu primeiro filho tem a sensação de que está se transformando em um cachorro. A trama é cheia de reflexões sobre a situação da mulher com a chegada da maternidade, em que todas as novas responsabilidades se somam às já existentes, com o acréscimo de um organismo inundado por uma carga hormonal gigantesca, somada à privação do sono e a presença de um marido que nem sempre ajuda. A mistura de afeto e fúria se faz presente em vários momentos e o filme investe nesta mistura num misto de humor, drama e surrealismo. O problema é que algo se perdeu na transição, o roteiro mal amarrado deixa a trama desengonçada e com a estranha sensação de que nada avança no decorrer do filme. As reflexões promissoras caminham para o lugar comum, as possibilidades se dissolvem, o surrealismo se torna repetitivo, o humor fica sem graça, o drama se torna raso, de nada serve o esforço de Amy Adams sem o amparo de um roteiro consistente. Em determinado momento tudo caminha pelo caminho da obviedade. Em alguns momentos os diálogos de empoderamento feminino surgem somente para garantir algum engajamento à narrativa. Tudo soa postiço e artificial para completar o sabor de decepção. Amy conseguiu uma indicação ao Globo de Ouro de melhor atriz de comédia ou musical pelo seu esforço, mas eu só imaginava o que aconteceu com a diretora Marielle Heller para realizar um filme tão desconjuntado. Depois de trabalhos como atriz, Heller estreou na direção com o impactante Diário de uma Adolescente (2015), fez bonito com o excelente Poderia me Perdoar? (2018) e não decepcionou com Um Lindo Dia na Vizinhança (2019), mas em Canina ela parece ter errado o tom e, principalmente, no encadeamento de um roteiro que desperdiça uma ideia interessante. 

Canina (Nightbitch/ EUA - 2024) de Marielle Heller com Amy Adams, Scoot McNairy, Arleigh Snowden, Emmett Snowden, Jessica Harper, Zoë Chao, Mary Holland e Archana Rajan    ☻☻

sábado, 25 de janeiro de 2025

INDICADOS AO OSCAR 2025: ATRIZ

Cynthia Erivo (Wicked) nasceu em Londres e tem 38 anos, filha de nigerianos e também já brilhou nos palcos por seus dotes vocais. Embora já tenha uma indicação ao Oscar de melhor atriz por seu papel em Harriet (2019), Cynthia ficou famosa mundialmente por conta de seu papel nesta adaptação do famoso musical da Broadway. Ela  vive Elphaba uma jovem incompreendida devido a cor incomum de sua pele - e devido a uma série de acontecimentos ela irá se tornar a famosa Bruxa Má do Oeste no Reino de Oz. Se Cynthia for premiada, ela fará parte do seleto grupo EGOT, já que ela já possui um EMMY, um Tony, um Grammy e um Emmy. Falta só um Oscar para a atriz completar a coleção dos maiores prêmios do entretenimento dos EUA.

Demi Moore (A Substância) ouve desde o Festival de Cannes do ano passado o burburinho sobre uma possível indicação ao Oscar para ela. O problema: o preconceito da Academia com os filmes de terror. Porém, o body horror quebrou barreiras com sua trama sobre hetarismo, procedimentos estéticos e desconstrução do selfie, tornando-se um dos filmes mais falados de 2024. Demi vive Elizabeth Sparkle uma atriz que entra em crise após ser demitida após décadas a frente de um programa de TV. Ela apela então para um procedimento que pode mudar sua vida para sempre. Mesmo participando de filmes indicados ao Oscar como Ghost (1990), Questão de Honra (1992) e Margin Call (2011), esta é a primeira vez que Demi é indicada ao prêmio (e se tornou a favorita) 
Fernanda Torres (Ainda Estou Aqui)
é a sexta latino-americana a ser indicada ao Oscar de melhor atriz (e a primeira foi a mãe dela, Fernanda Montenegro por Central do Brasil/1998). Pelo papel de Eunice Paiva no longa de Walter Salles, ela já ganhou o Globo de Ouro de atriz em drama, o Satellite Awards e muitos outros reconhecimentos por seu trabalho tão intimista quanto devastador. Ela vive a esposa do deputado Rubens Paiva, ela viu o esposo ser levado para um depoimento durante a ditadura militar no Brasil e nunca mais o viu retornar. Sua preocupação, indignação e cuidado com os filhos enquanto tenta descobrir a verdade ganhou fãs ao redor de todo o mundo. Será que a brasileira Fernanda irá vingar sua mãe? Esta é a primeira indicação de Fernanda ao Oscar. 
 
Karla Sofía Gascón (Emilia Pérez) premiada como melhor atriz no Festival de Cannes ao lado de suas colegas de elenco, a espanhola já fez História ao se tornar a primeira mulher trans indicada ao Oscar. Houve um momento em que ela foi favorita ao prêmio, mas o longa francês (falado em espanhol e ambientado no México) se meteu em tantas polêmicas que todo seu favoritismo foi abalado nas últimas semanas. Karla vive a personagem do título, a nova identidade de um traficante sanguinário que muda de vida ao redefinir seu sexo e viver escondido na trama de um musical! O longa obteve 13 indicações ao Oscar e resta saber se terá fôlego até lá para vencer algumas categorias. É a primeira indicação de Karla ao prêmio da Academia. 
 
 Mikey Madison (Anora) nasceu em Los Angeles e aos 24 anos se tornou a mais jovem no páreo da categoria. Indicada a todos os prêmios da temporada, ela tem a seu favor a projeção de estar no grande premiado com a Palma de Ouro no Festival de Cannes do ano passado. Antes de sua aclamação como a garota de programa que se casa com o herdeiro de um oligarca russo (e gera uma verdadeira crise na família do marido), Mikey era conhecida como uma das garotas perdidas de Era Uma Vez em Hollywood (2019) e um dos destaques do penúltimo filme da franquia Pânico (2022). Antes de ser reconhecida na tela grande, a jovem atriz participou das seis temporadas da série Better Things no canal FX.
 
A ESQUECIDA: Marianne Jean Baptiste (Hard Truths) já tem uma indicação ao Oscar no currículo, só que na categoria de coadjuvante por seu trabalho em Segredos e Mentiras (1996) do diretor Mike Leigh. Leigh e Marianne repetem a parceria  quase trinta anos depois e ela ficou novamente na mira do Oscar por viver uma personagem que tem dificuldades em se relacionar com os outros por conta de seu pavio curto e temperamento difícil. A crítica foi unânime em aclamar o trabalho da atriz, mas a produção modesta e a falta de investimento em campanhas para prêmios reduziram suas chances. Se serve de consolo, estrelas oscarizadas como Nicole Kidman, Tilda Swinton, Angelina Jolie, Kate Winslet e a renascida Pamela Anderson também ficaram de fora.

sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

PL►Y: A Garota da Agulha

Victoria: o robusto azarão do Oscar de Filme Internacional.

Dentre os cinco indicados a Melhor Filme Internacional no Oscar 2025, provavelmente A Garota da Agulha esteja no desconfortável posto de azarão, afinal, três de seus concorrentes concorrem em outras categorias (a animação Flow da Letônia concorre em duas categorias, o brasileiro Ainda Estou Aqui concorre em três e o francês Emília Perez concorre em treze), já o outro concorrente (A Semente do Fruto Sagrado que concorre pela Alemanha) é um dos três filmes em língua não inglesa mais comentados do ano passado. No entanto, o longa dinamarquês tem méritos suficientes para chamar atenção, dentre os fatores que o cravou no quinta vaga da disputa (desbancando filmes favoritos à vaga como o italiano Virmiglio, o documentário senegalês Dahomey e o irlandês Kneecap) está a habilidade do diretor Magnus Van Horn de emoldurar sua trama dramática com um estilo expressionista desde as primeiras cenas para ressaltar os horrores presentes no caminho de Karoline (Victoria Carmen Sonne), uma jovem operária de uma fábrica de Compenhague no ano de 1919. Seu esposo foi para a Guerra e há mais de uma ano e desde então não tem notícias dele, com isso, as dificuldades financeiras só crescem e a fazem procurar um lugar mais barato para viver. Ela encontra algum alento ao se se envolver com Jørgen (Joachim Fjelstrup), seu chefe na fábrica. No entanto, o que parecia a promessa de dias melhores tornará as coisas ainda mais complicadas, já que a mãe dele desaprova o romance e gera ainda mais complicações para a protagonista. Diante de tantos acontecimentos ruins, ela irá conhecer Dagmar (a sempre ótima Trine Dyrholm), uma mulher mais velha que vive com a filha em uma delicatessen que serve de fachada para adoção clandestina de bebês. No entanto, nada é o que parece e Karoline se vê diante de uma macabra realidade que pode levá-la até mesmo para à prisão.  Os méritos de A Garota da Agulha estão em contar sua história como se fosse um drama disfarçado de filme de terror, para depois revelar-se o oposto, isso funciona para  prender a atenção da plateia, ainda mais com o auxílio das atuações poderosas de sua dupla de atrizes. Outro destaque da produção é a belíssima fotografia em preto e branco, trabalhando luzes e sombras na medida certa para deixar o espectador apreensivo perante os segredos que se revelam aos poucos na tela.

A Garota da Agulha (Pigen med nålen / Dinamarca - Polônia - Suécia) de Magnus Van Horn com  Victoria Carme Sonne, Trine Dyrholm, Ava Knox Martin, Joachim Fjelstrup, Besir Zeciri, Ari Alexander, Tessa Hoder e Søren Sætter-Lassen. ☻☻☻☻

quinta-feira, 23 de janeiro de 2025

INDICADOS AO OSCAR 2025

Ainda Estou Aqui: cinema brasileiro fazendo história no Oscar.    

Demorei muito para postar algo sobre as indicações ao Oscar por aqui, mas acredito que muita gente ficou surpresa com o desempenho do brasileiro Ainda Estou Aqui. Já era esperado que o filme aparecesse na categoria de filme internacional e a indicação para melhor atriz para Fernanda Torres também era algo cada vez mais concreto. Algumas revistas apontavam uma terceira indicação em roteiro adaptado, mas como o filme ficou de fora, eu já estava satisfeito ao ter duas categorias para torcer. Porém, quando saiu a lista dos dez indicados a Melhor Filme, veio a maior surpresa! Vi em alguns sites que o filme teve a melhor média de bilheteria por sala em sua estreia nos EUA, um desempenho maior que do badalado O Brutalista (que ainda é o favorito na categoria de melhor filme). Maior concorrente no Brasil em Filme Internacional ainda é Emília Perez, que tem um trabalho árduo pela frene para não perder seu destaque com as treze indicações perante as críticas que recebe por sua narrativa equivocada. A maior surpresa foi ver todas as que concorreram com Fernanda Torres no Globo de Ouro de Atriz dramática (Nicole Kidman, Tilda Swinton, Pamela Anderson, Kate Winslet e Angelina Jolie) ficarem de fora enquanto a atriz cravava sua indicação. Outras surpresas foram as duas indicações para o elenco de O Aprendiz, Danielle Deadwyller (que estava cotada por Piano de Família) de fora novamente do Oscar e Margareth Qualley fora de atriz coadjuvante, se bem que Demi Moore foi indicada à melhor atriz, então, Margareth acabou indicada de qualquer jeito... A seguir todos os indicados que continuarão suas campanhas até a cerimônia do dia 02 de março.

    Melhor Filme
    'Anora'
    'O Brutalista'
    'Um Completo Desconhecido'
    'Conclave'
    'Duna: Parte 2'
    'Emilia Pérez'
   “Ainda Estou Aqui"
    'Nickel Boys'
    'A Substância'
    'Wicked'

    Direção
    Sean Baker - 'Anora'
    Brady Corbet - 'O Brutalista'
    James Mangold - 'Um Completo Desconhecido'
    Jacques Audiard - 'Emilia Pérez'
    Coralie Fargeat - 'A Substância'

 Ator
    Adrien Brody - 'O Brutalista'
    Timothée Chalamet - 'Um Completo Desconhecido'
    Colman Domingo - 'Sing Sing'
    Ralph Fiennes - 'Conclave'
    Sebastian Stan - 'O Aprendiz'

Atriz
    Cynthia Erivo - 'Wicked'
    Karla Sofía Gascón - 'Emilia Pérez'
    Mikey Madison - 'Anora'
    Demi Moore - 'A Substância'
   Fernanda Torres - “Ainda estou aqui"

   Ator Coadjuvante
    Yura Borisov - 'Anora'
    Kieran Culkin - 'A Verdadeira Dor'
    Edward Norton - 'Um Completo Desconhecido'
    Guy Pierce - 'O Brutalista'
    Jeremy Strong - 'O Aprendiz'

   Atriz Coadjuvante
    Monica Barbaro - 'Um Completo Desconhecido'
    Ariana Grande - 'Wicked'
    Felicity Jones - 'O Brutalista'
    Isabella Rossellini - 'Conclave'
    Zoe Saldaña - 'Emilia Pérez'

      Roteiro Adaptado
    'Um Completo Desconhecido'
    'Conclave'
    'Emilia Pérez'
    'Nickel Boys'
    'Sing Sing'

    Roteiro Original
    'Anora'
    'O Brutalista'
    'A Verdadeira Dor'
    'Setembro 5'
    'A Substância'

      Filme Internacional
    “Ainda estou aqui" - Brasil
    'A Garota da Agulha' - Dinamarca
    'Emilia Pérez' - França
    'A Semente do Fruto Sagrado' - Alemanha
    'Flow' - Letônia

   Animação
    'Flow'
    'Divertida mente 2'
    'Memórias de um caracol'
    'Wallace & Gromit: Avengança'
    'O robô selvagem'

   Figurino
    'Um Completo Desconhecido'
    'Conclave'
    'Gladiador 2'
    'Nosferatu'
    'Wicked'

    Maquiagem e cabelo
    'Um Homem Diferente'
    'Emilia Pérez'
    'Nosferatu'
    'A Substância'
    'Wicked'

    Trilha Sonora
    'O Brutalista'
    'Conclave'
    'Emilia Pérez'
    'Wicked'
    O Robô Selvagem'

   Curta-metragem com atores
    'A lien'
    'Anuja'
    'I'm not a robot'
    The last ranger'
    'The man who could not remain silent'

    Curta-metragem Animado
    'Beautiful men'
    'In the shadow of cypress'
    'Magic candies'
    'Wander to wonder'
    'Yuck!'

    Canção original
    'El Mal' - 'Emilia Pérez'
    'The journey' - 'The six triple eight'
    'Like a bird' - 'Sing sing'
    'Mi camino' - 'Emilia Pérez'
    'Never too late' - 'Elton John: Never too late'

    Documentário
    'Black box diaries'
    'No other land'
    'Porcelain war'
    'Soundtrack to a coup d'etat'
    'Sugarcane'

      Documentário de curta-metragem
    'Death by numbers'
    'I am ready, warden'
    'Incident'
    'Instruments of a beating heart'
    The only girl in the orchestra'

    Direção de Arte
    'O Brutalista'
    'Conclave'
    'Duna: Parte 2'
    'Nosferatu'
    'Wicked'

    Montagem
    'Anora'
    'O Brutalista'
    'Conclave'
    'Emilia Pérez'
    'Wicked'

   Som
    'Um Completo Desconhecido'
    'Duna: Parte 2'
    'Emilia Pérez'
    'Wicked'
    'O Robô Selvagem'

    Efeitos Visuais
    'Alien: Romulus'
    'Better Man: A História de Robbie Williams'
    'Duna: Parte 2'
    'Planeta dos Macacos: O Reinado'
    'Wicked'

   Fotografia
    'O Brutalista'
    'Duna: Parte 2'
    'Emilia Pérez'
    'Maria Callas'
    'Nosferatu'

quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

10 + 4EVER: David Lynch

 20 de janeiro de 1946 ✰ 15 de janeiro de 2025
 
Nascido na cidade de Missoula no estado de Montana, David Keith Lynch veio de uma família de situação econômica confortável. Filho de um pesquisador do departamento de agricultura e uma professora de inglês, sua família teve origem na Finlândia e David teve uma educação presbiteriana enquanto morou em diversas partes dos Estados Unidos. O constante deslocamento desenvolveu no jovem Lynch um constante olhar de estranhamento ao que para muitos era visto como natural, despertando sua curiosidade para o que estava abaixo da superfície das aparências do american way of life (um dos aspectos mais marcantes de sua cinematografia). Quem quiser conhecer um pouco mais de como o diretor moldou o seu estilo, pode procurar o documentário David Lynch: A Vida de Um Artista (2016), que demonstra como ele se tornou um mestre em lidar com cenas do imaginário, o flerte constante entre o sonho e o pesadelo, o surrealismo e um casamento inesperado entre o belo e o bizarro. Embora não lançasse um longa metragem desde 2006, Lynch permaneceu ativo nos últimos anos, realizando clipes, curtas, exposições e produções musicais, além de ter seguido inspirando jovens cineastas, como Coralie Fargeat (A Substância) e Jane Schoenbrun (Eu Vi o Brilho da TV). Lynch é um artista multifacetado, que deixa uma obra imortal incrível e deixa de ser um dos maiores nomes do entretenimento para se tornar um dos deuses do Cinema. Em homenagem a um dos meus cineastas favoritos, relembro aqui minhas dez obras favoritas (e somente sua rejeitada versão de Duna/1984 ficou de fora). Nem todos os filmes abaixo possuem resenhas aqui no blog, mas ao longo do ano irei postar os que ainda não foram comentados em homenagem ao cineasta:
 
#10 "Twin Peaks: Os Últimos Dias de Laura Palmer " (1992)
Se a série Twin Peaks degringolou quando Lynch precisou se afastar para voltar para seus trabalhos no cinema, o diretor tentou compensar os fãs perante a horrorosa segunda temporada com este filme que decepcionou porque muitos imaginaram que traria explicações sobre os mistérios da trama. Na verdade, Lynch faz exatamente o contrário, deixando tudo ainda mais complexo e cheio de camadas sobre a morte da bela estudante Laura Palmer na pacata cidade de Picos Gêmeos. 
 
Em seu filme de estreia, Lynch já deixava claro que não queria que esperassem dele uma história convencional com começo, meio e fim ou algo realista. Em menos de hora e meia de duração, o diretor de 31 anos já caprichava na história de Henry Spencer (Jack Nance) um homem aparentemente comum que precisa lidar com um bebê que não para de chorar enquanto conhece personagens bastante, digamos, peculiares. Rotulado de terror surrealista, o filme não fez sucesso em seu lançamento, mas ao longo do tempo gerou curiosidade e se tornou um filme cultuado que já demonstrava o talento do diretor em lidar com estranhezas narrativas. 

Reza a lenda que a ideia do filme surgiu quando Laura Dern mencionou o nome da cidade natal de seu esposo (Inland Empire) em uma conversa. A mente de Lynch divagou imediatamente sobre o nome daquela cidade e construiu aquele que seria seu último longa-metragem. Uma coleção de cenas sobre uma atriz que não sabe distinguir o que é realidade, sonho, memória ou ficção. O resultado pode até soar caótico, mas é uma verdadeira aula de como construir um cinema atmosférico enquanto mescla mistério ao drama de sua personagem. O filme também ficou famoso pela campanha solitária de Lynch para conseguir uma indicação ao Oscar para sua musa-mor: Laura Dern. 
 
#07 "Coração Selvagem" (1990)
David Lynch estava no auge após o sucesso da série Twin Peaks e se afastou da série para criar mais um longa-metragem. Se o programa de TV saiu perdendo, Lynch levou a Palma de Ouro do Festival de Cannes ao contar a história de amor entre Sailor (Nicolas Cage) e Lula (Laura Dern) enquanto fogem de um assassino pelas estradas dos Estados Unidos. O filme se tornou mais um marco da forma como Lynch desbrava a superfície do American Way of Life, rendeu uma indicação para Diane Ladd (mãe da Laura no filme e fora dele) no Oscar de coadjuvante e ainda revelou para o mundo a icônica música Wicked Game de Chris Isaak. Um clássico. 
 
#06 "Uma História Real" (1999)
Depois de tantos filmes criando o casamento perfeito entre o belo e o bizarro, o cineasta surpreendeu todo mundo por fazer exatamente o que ninguém esperava dele. Ele pegou a história real de um senhor com mais de setenta anos, Alvin Straight (Richard Fansworth), que está cheio de problemas de saúde e, imaginando que o inevitável está cada vez mais perto, ele planeja viajar mais de quatrocentos quilômetros para encontrar um irmão com quem não fala há tempos. Só que, como sua licença de motorista foi retirada, ele fará todo o trajeto em seu cortador de grama! Embora seja completamente diferente de seus outros filmes, Lynch consegue imprimir ao filme uma atmosfera de sonho que aumenta ainda mais o lado emocional da história. Fansworth se tornou o ator de maior idade indicado ao Oscar de melhor ator até então e Lynch ainda adorou o trocadilho do filme em inglês The Straight Story (traduzindo: A História Careta). 

Lynch ficou cinco anos sem dirigir um longa metragem e, se desconsiderarmos que seu filme anterior ainda estava vinculado a Twin Peaks, o diretor completava sete anos sem apresentar material inédito aos fãs. Por conta disso, este aqui se tornou bastante importante para toda uma nova geração de fãs que não sabiam do que o diretor era capaz. O longa conta a história de um músico (Bill Pullman) que é assombrado por um crime terrível envolvendo a esposa (Patricia Arquette). Sua dor é tão grande, que no corredor da morte, ele se transforma em outra pessoa (Balthazar Ghety) que irá se apaixonar por Alice (a mesma Patricia Arquette) em um mundo diferente do anterior. Esteticamente o filme é impecável e as obsessões de Lynch entre o sonho e a realidade permanecem funcionando que é uma beleza. 

David Lynch foi fundamental para criar toda a atmosfera desta série que marcou época em um período em que quem era consagrado no cinema não migrava para projetos na televisão. No entanto, Lynch só dirigiu dois episódios na primeira temporada (o primeiro e o terceiro) e quatro na segunda temporada quando uma série de pessoas despreparadas assumiram o programa para fazer bobagem (ao ponto de contarem o grande mistério no meio, inserir um bando de subtramas que não interessavam a ninguém e fazer um programa sensacional se transformar em uma novela desconjuntada). Sorte que Lynch voltou e tentou colocar as coisas nos eixos. O cineasta ainda participou de vários projetos baseados na misteriosa morte de Laura Palmer, com um retorno do agente Dale Cooper (Kyle McLachlan) dando continuidade ao destino sombrio de seu personagem depois de quase trinta anos. 

Depois da consagração absoluta com Homem Elefante e todos os aborrecimentos com a adaptação encomendada de Duna (1984), Lynch precisava relaxar e foi quando realizou um dos seus trabalhos mais referênciais. Veludo Azul foi protagonizado por sua então namorada, Isabela Rosselini (belíssima e premiada com o Independent Spirit daquele ano) encarnando uma cantora que teve o filho sequestrado por um grupo de criminosos. O caminho dela cruza com o do bom moço Jeffrey (Kyle MacLachlan) e a namorada, Sandy (Laura Dern) e a colisão desses dois mundos de atmosferas tão distintas acontece por conta de uma orelha perdida!!!! A maestria com que Lynch conduz  a narrativa lhe valeu a segunda indicação ao Oscar de direção. 
 
Lembro até hoje quando encontrei este filme em DVD em uma banca de jornal nos tempos da faculdade e fui para aula ansioso para assistir ao chegar em casa. Lynch faz um filme arrebatador baseado na vida de John Merrick, que possui sua aparência desconfigurada por conta de uma severa doença. Descoberto por um médico (vivido por Anthony Hopkins), Merrick  (magistral trabalho de John Hurt) passa de atração de circo para atração científica e passa por situações que só revelam que por baixo de sua aparência, existe um coração de ouro incompreendido lidando com um mundo cruel. Este foi o segundo longa do cineasta e o projetou mundialmente recebendo oito indicações ao Oscar: melhor filme, diretor, ator, roteiro, direção de arte, figurino, montagem e trilha sonora. Talvez este seja o filme mais querido do diretor. 

Talvez seja pelo fato de ser o único da lista que assisti no cinema que o sonoro Mullholand Drive fica no topo de minha preferência. Lembro até hoje quando  assisti no cinema da faculdade o filme com minha amiga Alê e ter a sensação da plateia inteira absorvida em silêncio até após subirem os créditos. Havia acabado de participar de uma hipnose coletiva? Concebido para ser um programa de televisão, a ideia foi cancelada pelos produtores que não compraram a ideia de uma jovem atriz (Naomi Watts arrasadora e chegando ao status de estrela que merecia com o papel) e uma bela atriz desmemoriada (a bela Laura Harring) que ficam amigas em Hollywood. Lynch pegou o material que havia filmado e criou cenas adicionais, fazendo um verdadeiro deleite para quem curte seu cinema entre sonho, pesadelo, o inconsciente, o delírio, a ficção e a realidade. Cheio de simbologias sobre a forma como o cinema mescla todos os elementos citados, Lynch levou o prêmio de melhor direção no Festival de Cannes e foi indicado mais uma vez ao Oscar de melhor direção. Nascia um filme digno de culto.

quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

PL►Y: A Exposição

 

Viv e Liam: um casal exposto. 

D (Viv Albertine) e H (Liam Gillick) são dois artistas casados que vivem em uma casa estilosa que possui a pretensão de ser também uma obra de arte. Ela produz arte performática diante de uma janela fechada, ele produz arte com as tela do computador, os dois trabalham em andares diferentes da casa e se comunicam por um sistema de interfone em que conversam sobre a manutenção de algo que precisa de reparos ou a vontade de fazer sexo. A escada que une os andares parece uma hélice de DNA gigantesca e representa o vínculo entre um casal maduro que, evidentemente, já possui algum tempo de relação. Existe uma certa tensão entre os dois por conta de seus respectivos trabalhos, mas sexualmente os dois se entendem bem e a câmera da diretora Joanna Hogg soa como uma invasora naquele ambiente para nos revelar um pouco da rotina daquele casal em suas vidas sem sobressaltos, mas que recebe alguma dose de emoção quando planejam vender a casa ou participar de um programa de entrevistas. Embora o casal seja composto por dois artistas, o roteiro de Hogg está mais interessado em exibir a relação entre os dois como se habitassem uma espécie de Big Brother em formato intimista. Em vários momentos tive a impressão que a dupla de atores realmente formava um casal que expõe a vida por aqui, ao ponto de imaginar que em algum momento o registro que assistimos seria revelado como se fosse uma obra a ser exposta em alguma galeria. Hogg repete aqui novamente uma narrativa arrastada sobre personagens cheios de possibilidades, mas presos em suas existências óbvias em que o tédio soa inevitável. Para espantar o marasmo tem aquelas cenas de intimidade que a diretora filma de forma surpreende, honesta e sem firulas. No fim das contas eu fiquei mais surpreso em descobrir que Viv Albertine tem uma carreira consolidada na música e este foi seu único papel no cinema, enquanto Liam Gillick é um artista britânico sem experiência como ator, mas que consegue construir um personagem naturalmente atraente sem muito esforço. Quem se aventurar pelo filme, pode ver Tom Hiddleston em mais uma parceria com a diretora. Esta é a terceira vez em que trabalham juntos, mas a primeira após ele ficar conhecido com o personagem Loki da Marvel. O personagem de Tom aqui é pequeno, mas a presença do ator ajuda a elevar o charme desta produção com roteiro bastante disperso. 

A Esposição (Exhibition / Reino Unido - 2013) de Joanna Hogg com Viv Albertine, Liam Gillick, Tom Hiddleston, Mary Roscoe, Harry Kershaw, Sirine Saba e Chris Wilson.

segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

NªTV: Cem Anos de Solidão

Diego Vásquez: um clássico como manda o figurino.

Não sei se já escrevi por aqui alguma vez, mas dois livros estão no topo da minha lista de favoritos de todos os tempos. Por algum tempo tentei um desempate, mas não tem jeito. Os dois estão lá, no ponto mais alto das obras que você carrega para o resto da vida na memória (e talvez, até para depois dela, vai saber...). Um deles é Ensaio Sobre a Cegueira de José Saramago, que recebeu uma competente adaptação cinematográfica pelas mãos de Fernando Meirelles em 2008, ano em que concorreu à Palma de Ouro no Festival de Cannes. O outro é Cem Anos de Solidão de Gabriel García Marquez, um clássico absoluto da literatura mundial. Não por acaso os dois autores já foram premiados com o Nobel de Literatura e, por algum tempo, eu dizia que as duas obras acabaram com a minha vida, já que passei um bom tempo sem encontrar algum livro que prendesse minha atenção (e como me disse um amigo certa vez: "também, olha o nível em que você botou a régua"). Enfim, já estou curado e li vários outros livros depois, mas os dois permanecem lá, no topo, intocáveis. Portanto, foi com alguma preocupação que recebi a notícia de que a Netflix faria uma adaptação em formato de minissérie da obra de García Marquez, afinal, quem leu, entende muito bem o vespeiro que qualquer envolvido se meteria ao bancar uma obra audiovisual baseada em um clássico tão marcante. A trama ambientada na cidade de Macondo é puro realismo fantástico, mas sem perder de vista uma alegoria política que fala muito sobre a História da América Latina e seus conflitos. Dividida em duas partes (oito episódios foram lançados ao final do ano passado e a outra metade tem previsão para este ano), imaginei que a Netflix dividiria as temporadas naquele ponto, no meio do livro em que eu parei de ler por atravessar um verdadeiro luto pelos personagens, mas me surpreendi com a opção da produção. A trama gira em torno da família formada com o casamento dos primos Úrsula (Marleyda Soto) e José Arcadio Buendía (Édgar Vittorino), um casal apaixonado, mas um tanto assombrado pelo tabu do incesto (ela sempre teme que um de seus filhos nasça com rabo de porco por conta disso). Depois de algumas desavenças no local em que viviam, os dois resolvem partir rumo ao mar junto com um grupo de amigos. Eles não encontram o oceano, mas depois de vagarem por vários quilômetros, resolvem fundar um vilarejo chamada Macondo. O vilarejo irá crescer e servir de cenário para a família que se expande em torno de nomes que se repetem várias vezes na arvore genealógica. Entre irmãos, primos e agregados, os Arcadio Buendía  logo irão descobrir que o crescimento da cidade terá seu preço, sobretudo quando envolve novos moradores e visões políticas diferentes. Cem Anos de Solidão utiliza o fantástico em sua trama para falar de vários assuntos, o que confere leveza a algumas temáticas pesadas que encontra pelo caminho. A trama é de uma complexidade tão grande que García Marquez tinha plena consciência da dificuldade que seria autorizar uma adaptação. Escaldado pela péssima adaptação Made in Hollywood de O Amor nos Tempos do Cólera (2007) feita pelo inglês Mike Newell e estrelada por Javier Bardem e Fernanda Montenegro, o autor exigiu que a trama fosse filmada na Colômbia, com direção e elenco latinos. Não por acaso, seus filhos assinam a produção com o rigor necessário para que tudo fique nos eixos. O resultado dos primeiros oito episódios impressiona pelo cuidado na recriação daquele universo inesquecível. O único problema que identifiquei fica por conta da organização dos oito episódios, que nem sempre encontram o momento certo de terminar e prosseguir a história, oscilando em clímax e anticlímax diversas vezes. Enfim, diante do desafio gigante que os envolvidos criaram para si, a minissérie de Cem Anos de Solidão cumpre seu papel de honrar o legado do livro e, com a pausa no meio das temporadas, motiva ainda mais quem não conhece  a obra a procurar spoilers em um narrativa literária genial.  

Cem Anos de Solidão (Cien años de Soledad/ Colômbia - 2024) de Laura Mora e Alex Garcia Lopez com Viña Machado, Jesus Reyes, Claudio Cataño, Diego Vásquez, Marleyda Soto, Loren Sofia, Janer Villareal e Akima. ☻☻☻

domingo, 12 de janeiro de 2025

PL►Y: Micróbio e Gasolina

Baquet e Dargent: amigos na estrada.

Micróbio (Ange Dargent) e Gasolina (Théophile Baquet) são dois adolescentes que estudam na mesma escola e que aos poucos se tornam amigos. Enquanto Gasolina é descolado e recebeu o apelido por conta do cheiro adquirido por ajudar o pai na oficina, Micróbio é tímido e sempre fica irritado quando acham que ele é uma menina. Os dois começam a passar cada vez mais tempo juntos e o sentimento de não se encaixarem muito bem onde vivem (algo bastante comum na adolescência e a visão da vida adulta de quem está por perto), faz com que construam um "veículo casa" para visitarem o centro da França e reencontrar um antigo acampamento que frequentaram na infância. A viagem oferece ao filme ares de um road movie teen e resulta em diálogos interessantes, algumas situações inusitadas e... não espere muito mais do que isso. Michel Gondry tem um Oscar pelo roteiro original em parceria com Charlie Kauffman pelo cultuado Brilho Eterno de Uma Mente sem Lembranças (2004), mas em entrevistas sempre alega que possui dificuldade em construir histórias com princípio, meio e fim. Micróbio e Gasolina demonstra bem isso, mas o resultado não deixa de ser um retrato interessante sobre a amizade e o amadurecimento. Longe da mãe amorosa (vivida por Audrey Tautou) de Micróbio ou da frieza dos pais de Gasolina, os dois garotos precisam se virar para atravessarem as desventuras do caminho. Vale destacar que a casa sobre rodas inventada pelos dois também ressalta uma das marcas de Gondry em sua capacidade de explorar um cinema mais lúdico e de efeitos práticos, algo que ele já fazia em clipes que fizeram história como Let Forever Be do Chemical Brothers e Come into my World da Kylie Minogue. No entanto, o maior acerto do filme foi ter escalado dois atores estreantes certeiros para os papéis principais. Dargent e Baquet são bastante convincentes em cena e realmente parecem ser amigos ao longo de todo o filme. Meu único problema com a produção é que o roteiro soa disperso demais, bastante aleatório entre as situações em que insere os meninos, no entanto, nada que comprometa o frescor despretensioso que o filme carrega. 

Micróbio e Gasolina (Microbe & Gasoline / França - 2015) de Michel Grondry com Ange Dargent, Teóphile Baquet, Diane Besnier, Audrey Tautou, Vincent Lamoureux, Douglas Brousset, Agathe Peigney e Charles Raymond. ☻☻

CATÁLOGO: Temporada de Caça

Nolte e Coburn: o amor de filho pelo pai.

Sabe aquele filme que você ouve falar e fica curioso de assistir, mas o tempo passa, você não o encontra e você acaba esquecendo? Minha relação com Temporada de Caça foi exatamente assim, lembro que na cerimônia do Oscar de 1999 o filme recebeu o Oscar de melhor ator coadjuvante para o veterano James Coburn e que Nick Nolte concorria como ator principal. Os dois vivem respectivamente pai e filho em uma relação bastante complicada, que se torna mais um ponto para que o protagonista perca as estribeiras conforme o filme caminha para o desfecho. Nick Nolte interpreta Wade Whitehouse, o policial de uma pacata cidadezinha em que nada demais acontece ao longo do ano. Se a vizinhança é puro sossego, a vida de Wade tem lá sua cota de problemas, ele tem um relacionamento complicado com a ex-mulher e quando precisa ficar com a filha, ele nunca sabe o que fazer para agradar. Ele encontra algum alento nos braços de Margie (Sissy Spacek), que ele conhece desde a infância e vivem um romance sossegado. O problema é que Wade tem algumas marcas emocionais bastante complicadas, especialmente por ter crescido com a presença de um pai abusivo dentro de casa. Glen Whitehouse sempre foi bastante agressivo com os filhos e a esposa. Quem ficou farto de tudo isso e resolveu viver longe foi o irmão de Wade, Rolfe (Willem Dafoe) que narra o filme com um a entonação tranquila que soa dissonante com o que vemos na tela. Os três irão se reunir novamente por conta de um falecimento na família e o nível de estresse só aumenta por conta de uma morte ocorrida na temporada de caça da região. Um dos habitantes é encontrado morto e o único que estava por perto, Jack (Jim True-Frost), jura que tudo não passou de um acidente. Wade não acredita naquela justificativa e o fato ajuda a corroer ainda mais a sua estabilidade. O diretor e roteirista Paul Schrader adapta o livro de Russel Banks na rédea curta com uma tensão crescente, sobretudo pela postura do policial que começa como um sujeito pacato e se torna cada vez mais descontrolado, afastando até mesmo aqueles que sentem algum afeto por ele. As paisagens bucólicas e a ideia do marasmo só ressaltam o que aquele ambiente pode ter de sufocante para um sujeito com sede de sangue. A agressividade se torna cada vez mais a tônica das relações no roteiro e rende à Nick Nolte um dos seus melhores trabalhos, mas confesso que em alguns momentos eu achei até engraçada toda a tensão que existia entre pai e filho (e acho que essa era a proposta), ainda que a relação entre os dois se mostre cada vez mais irremediável rumo ao trágico. Temporada de Caça é o tipo de filme em que aparentemente nada acontece, mas não se engane, abaixo da superfície, existe um personagens corroído pouco a pouco (do jeito que Schrader gosta). Vale lembrar que 1999 foi um ano estranho para o Oscar, foi aquele em que Fernandona perdeu para Gwyneth Paltrow, que Ian McKellen perdeu para Roberto Benini, que Judi Dench discursou que merecia só um pedacinho do Oscar (por aparecer em menos de oito minutos como coadjuvante em um filme de duas horas) e também foi aquele em que Ed Harris era o favorito na categoria de ator coadjuvante e perdeu para James Coburn na força do ódio. A zebra estava solta.

Temporada de Caça (Affliction / EUA - 1998) de Paul Schrader com Nick Nolte, James Coburn, Sissy Spacek, Willem Dafoe, Jim True-Frost, Tim Post, Maria Seldes, Brigid Tierney, Holmes Osbourne e Mary Beth-Hurt. ☻☻☻

sábado, 11 de janeiro de 2025

PL►Y: O Mito Americano da Festa do Pijama

O mito: as obsessões de um cineasta.

David Robert Mitchell ganhou prestígio com o terror A Corrente do Mal (2014) que lhe garantiu lugar entre os melhores filmes daquele ano e uma preciosa indicação na categoria de melhor direção no Independent Spirit Awards (em que o filme também concorreu em melhor fotografia e montagem). Todo o sucesso aconteceu pela forma diferente com que o cineasta contava uma história em que a morte se tornava uma doença sexualmente transmissível (e que você deveria passar para outra pessoa o mais rápido possível, caso quisesse continuar vivo). O mais interessante é que ao assistir recentemente ao primeiro longa-metragem do diretor, você consegue perceber várias das mesmas inquietações dos personagens daquele hit do terror. Em O Mito Americano da Festa do Pijama o diretor apresenta um grupo de jovens que estão às voltas com várias festas que acontecem na mesma noite, uma delas ocorre até na escola. São adolescentes que estão com os hormônios à flor da pele, o que aguça a libido, mas que também carrega as cores das inseguranças em ser aceito por um grupo ou encontrar alguém que demonstre algum interesse por você. Como o título anuncia com sua pompa de dissertação de mestrado, Mitchell parece lidar com uma pesquisa de campo com mais de uma dezena de personagens, resultando em algo que parece o que Robert Altman faria se focasse sua lente astuta em um temática adolescente. No entanto, o senso de humor discreto e irônico que brotam de algumas situações (como o rapaz que reencontra duas irmãs gêmeas de seus tempos de escola e afirma estar apaixonado pelas duas), deixam a sensação que o filme quer se afastar ao máximo possível do humor que acostumamos a ver em filmes sobre adolescentes. Ele aqui é tão seco que parece funcionar como um anti-humor. Por vezes a impressão é que Mitchell fez uma verdadeira colagem de todos os personagens dos filmes de John Hughes e resolveu retirar todo o apelo pop daquelas clássicas comédias juvenis dos anos 1980. O ritmo é arrastado, os diálogos às vezes parecem caminhar para lugar algum e o resultado de cada cena é propositalmente disperso. No entanto, o diretor filma seus personagens (defendido por um elenco desconhecido eficiente) com bastante carinho, fazendo com que a maioria das cenas soem improvisadas como a vida. O fato do filme ser ambientado nos subúrbios de Detroit aumenta ainda mais a sensação de um certo desalento com as longas estradas, quarteirões e fábricas abandonadas que parecem ilustrar um passado que não serve mais aos desejos daqueles personagens que tem a vida toda pela frente. No final das contas, apesar dos vários personagens e diferentes anseios a serem trabalhados, o resultado consegue ser bastante coerente e até simpático. É interessante perceber que Mitchell depois se aventurou por filmes completamente diferentes deste aqui, criando narrativas mais complexas. Embora tenha se perdido um bocado em O Mistério de Silver Lake (2018), ele permanece fiel às suas obsessões enquanto cineasta. O diretor anda sumido desde então, mas seu novo projeto, Flowervale Street (com Anne Hathaway e Ewan McGregor), está previsto para estrear em 2026. 

O Mito Americano da Festa do Pijama (The Myth of the American Sleepover / EUA - 2010) de David Robert Mitchell com Marlon Morton, Claire Sloma, Amanda Bauer, Brett Jacobsen, Mary Wardell, Jade Ramsey, Nikita Ramsey e Annette DeNoyer. ☻☻