segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

HIGH FI✌E: Fevereiro

 Cinco filmes assistidos no mês que merecem destaque:





PL►Y: Casa Gucci

 
Leto, Al, Gaga, Adam e Irons: família do barulho. 

Eu quase fui assistir Casa Gucci enquanto estava em cartaz na minha cidade, mas confesso que as críticas mistas e o fato de ter duas horas e quarenta minutos de duração pesou muito em meio à uma crise de coluna (adoro cinema, mas minhas três hérnias de disco não cooperam muito nas cadeiras). Acabei deixando o filme escapar, o que foi bom para proporcionar um bem vindo distanciamento à toda voracidade com que o filme foi exposto e devorado pela mídia. O filme Casa Gucci era um projeto que há tempos habitava o imaginário de Hollywood, mas faltava um diretor com coragem para se embrenhar a história da família que carrega o nome da marca e foi dissecada no livro homônimo de Sara Gay Forden. Quem conhece a obra, garante que a trama real renderia muito melhor em uma minissérie, já que é repleta de intrigas, crimes, romance e traições com tempero fashionista, elementos que fariam a glória de qualquer novela e, de certa forma, Ridley Scott capta esta referência ao entregar um filme cheio de personagens e arcos que por vezes soam apressados e um tanto desiguais quando projetados lado a lado na tela grande. A vontade de abraçar o desenvolvimento de tantos personagens e subtramas, deixam a sensação que que lá pela sua segunda hora o filme perde foco e fôlego ao ceder mais espaço aos personagens que orbitam em torno de Patrizia Reggiani (Lady Gaga) e Maurizio Gucci (Adam Driver). A primeira parte do filme é dedicada aos dois, ela a herdeira de uma empresa de transporte ferroviário, ele o tímido herdeiro de um império da moda. Gaga e Adam tem química suficiente em cena para ganhar a torcida e a atenção do público, portanto, convencem como integrantes de uma história que combina amor e um tanto de ambição (e quem conhece a história real do casal, sabe exatamente como termina). Maurizio era filho de Rodolfo Gucci (Jeremy Irons) que não via com bons olhos aquela união, o que faz com que tio Aldo Gucci (Al Pacino) se aproxime dos pombinhos despertando o ciúme do filho, Paolo Gucci (Jared Leto), que nunca primou muito pelo bom senso ou bom gosto. Misture o ego dos membros desta família e o resultado é realmente explosivo, o que acabou afetando a marca que terminou vendida e sendo administrada por pessoas de fora do clã (atualmente pertence à marca Kering, cujo esposo de Salma Hayek é um dos proprietários). As atuações são carregadas, os sotaques são uma bagunça e Ridley Scott parece ter dado plena liberdade para que seus atores fizessem o que julgassem interessante para o filme. O resultado perde em termos de se tornar um retrato realista da glamourosa família e, principalmente, ao desviar o foco de Maurizio e Patrizia quando o roteiro apressa a transição da história de amor para uma espécie de ojeriza do rapaz tímido  (picado pela ambição) à sua parceira de, digamos, vida conjugal e maracutaias. Neste ponto, a transição de Adam Driver soa da noite para o dia, enquanto Gaga perde espaço de tela após conquistar o público com uma atuação feroz. Devo admitir que desde que assisti Casa Gucci, considero uma verdadeira injustiça a esnobada que ela recebeu do Oscar, já que sua Patrizia torna-se o trabalho mais marcante do filme. Cheia de camadas, Gaga consegue dar coerência à visão de mundo da personagem, ainda que ela meta os pés pelas mãos e o filme resuma o complexo desfecho da personagem naquele julgamento - e apenas ensaiando, com aquela letra tremida, o tumor no cérebro que veio a ser diagnosticado depois. Fosse dedicado ao escandaloso crime ocorrido  por encomenda que sepultou de vez a união de Maurizio e Patrizia, o filme teria sido muito melhor. Acho que nem precisa dizer que a família Gucci odiou o filme e considerou tudo uma afronta, mas o melhor comentário foi mesmo de Tom Ford, que fortaleceu a marca nos anos 1990 (e que no filme é vivido por Reeve Carney, o Dorian Grey de Penny Dreadful), que mencionou que durante o filme ria de algumas interpretações, mas não sabia se deveria fazer isso. Casa Gucci pode não ser o filme magnífico que queriam que ele fosse ao pagar o preço pela irregularidade, mas ainda assim merece atenção (nem que seja pelo trabalho de Lady Gaga). 

Casa Gucci (House of Gucci/EUA-Canadá /2021) de Ridley Scott com Lady Gaga, Adam Driver, Al Pacino, Jeremy Irons, Jared Leto, Jack Huston e Salma Hayek. 

Premiados SAG Awards 2022

No Ritmo do Coração: melhor elenco de 2021. 

E com o Screen Actors Guild realizado ontem algumas certezas sobre o Oscar ganham força (como na categoria de atriz coadjuvante) e algumas ficam ainda mais acirradas (melhor atriz e ator coadjuvante) o que faz a corrida pela estatueta dourada ficar mais emocionante (embora a Academia tenha tomado a controversa atitude de lançar um "Prêmio do público" votado pelo twitter (e que até o momento aponta Cinderela como favorito graças à fanbase de cantora Camila Cabello) e ter tirado várias categorias do dia da cerimonia para um borocoxô anúncio gravado. O grande vencedor da noite foi No Ritmo do Coração, filme da Apple distribuído no Brasil pela Amazon e que ganhou cada vez mais simpatia na reta final da temporada de ouro. Será o filme tem fôlego para ganhar o Oscar? Diante do descompasso entre os indicados entre os dois prêmios, acho difícil... mas pela sintonia em cena o elenco merecia o prêmio no SAG e no Oscar (se houvesse esta categoria). A seguir todos os ganhadores da noite:

CINEMA

Melhor Elenco

Melhor Ator

Melhor Atriz 
Jessica Chastain (Os Olhos de Tammy Faye)

Atriz Coadjuvante 
Ariana DeBose (Amor, Sublime Amor)

Ator Coadjuvante 

Elenco de Dublês 
007 - Sem Tempo para Morrer
 
Conjunto da Obra 
Helen Mirren
 
TELEVISÃO

Melhor Elenco em Série Dramática
Succession

Ator em Série Dramática 

Atriz em Série Dramática 

Melhor Elenco em Série de Comédia
Ted Lasso

Ator em Série de Comédia 
Jason Sudeikis (Ted Lasso)

Atriz em Série de Comédia 
Jean Smart (Hacks)

Atriz em Minissérie ou Telefilme
Kate Winslet (Mare of Easttown)

Ator em Minissérie ou Telefilme
Michael Keaton (Dopesick) 

Elenco de Dublês 

Round Six: grande premiado na TV. 

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

INDICADOS AO OSCAR 2022: Atriz Coadjuvante

Ariana DeBose (Amor Sublime Amor) No posto de favorita na categoria está uma novata em Hollywood. Não que Ariana seja uma estreante, já que sua carreira está cada vez mais marcada por musicais (ela esteve nas versões teatrais e televisivas de Company/2011 e Hamilton/2020, além da adaptação e Festa de Formatura/2020  para a Netflix). A cantora atriz e dançarina de origem afro-americana (com um tempero italiano) foi descoberta em uma da temporada 2009 do programa So You Think you Can Dance. Seu trabalho como Anita na nova versão do clássico musical pelas mãos de Steven Spielberg (o mesmo que oscarizou Rita Moreno na versão original) mostra que talento esta jovem artista tem de sobra. 

Aunjanue Ellis (King Richard) Nascida em São Francisco na Califórnia, a atriz despontou como uma das favoritas da categoria assim que o filme sobre a família das irmãs Williams foi lançado. Na pele da mãe que precisa colocar um pouco de noção na cabeça do marido Richard de vez em quando, Aunjanue tem momentos que roubam a atenção para si sem esforço. De presença forte, a sua primeira indicação ao Oscar celebra uma carreira que começou nos anos 1990 e que conta com participações em filmes oscarizados como Ray (2004), Histórias Cruzadas (2011) e Se A Rua Beale Falasse (2018).

Jessie Buckley (A Filha Perdida) Quem acompanha a carreira da atriz irlandesa sabe que ser notada pelo Oscar era questão de tempo. Ela chegou a ser indicada ao BAFTA por As Loucuras de Rose (2018), pouco antes de chamar atenção como a esposa de bombeiro grávida da minissérie Chernobyl (2019) da HBO. Logo depois lá estava ela em Judy - Muito Além do Arco-Íris (2019) e no estranho Eu Estou Pensando em Acabar com Tudo (2020). Desde que A Filha Perdida apareceu no Festival de Veneza suas atrizes foram muito elogiadas, mas os holofotes pareciam ir só para Olivia Colman, até que Jessie cravou sua primeira indicação numa das boas surpresas do Oscar para este ano.

Judi Dench (Belfast) Quando todo mundo imaginava que Caitriona Balfe seria indicada, eis que a Academia resolve indicar a veterana atriz inglesa mais uma vez. Não chega a ser um equívoco, mas deixou muita gente surpresa. Para Judi é um ótimo presente depois que seu filme mais famoso dos últimos tempos foi o vexaminoso Cats (2019). Na pele da vovó do menino protagonista inspirado na infância do diretor/roteirista Kenneth Brannagh, Judi tem uma participação bastante emocional. A atriz de 87 anos já tem uma estatueta de coadjuvante por Shakespeare Apaixonado (1998), além de cinco indicações como melhor atriz e outra de coadjuvante por Chocolat (2001)

Kirsten Dunst (Ataque dos Cães) Ela poderia ter sido indicada quando foi revelada pelo mundo aos doze anos como a complicada vampira Claudia de Entrevista com o Vampiro (1994). Poderia até ter sido lembrada por Maria Antonieta (2006) ou após ter sido considerada a melhor atriz no Festival de Cannes com Melancolia (2011), mas precisou lembrar em entrevistas que o Oscar nunca lembrava dela após quase trinta anos com bons trabalhos e nenhuma indicação para ser lembrada. Para reparar o erro a Academia não poderia ignorar o trabalho da atriz como a mulher às voltas com um cunhado grosseirão e um filho zeloso. Dunst apresenta um trabalho excelente, cheio de silêncios e oscilações em uma personagem que pode surpreender na cerimonia. 

A ESQUECIDA: Caitriona Balfe (Belfast) sua presença entre as indicadas era considerada certa, mas acabou ficando de fora, provavelmente perdendo o posto para sua parceira de elenco Judi Dench. A ex-modelo e atriz irlandesa ficou famosa mundialmente por seu trabalho na cultuada série Outlander (2014-2022) e de vez em quando encontra espaço nas gravações para performances no cinema. Com papéis em filmes como Jogo do Dinheiro (2016) e Ford Vs Ferrari (2019), seu trabalho maternal em Belfast é o que deve impulsionar sua carreira na telona. Pena que a indicação não veio. Outra cotada que foi esquecida foi Ruth Negga por Identidade, filme que passou em branco entre as indicações da Academia. 

domingo, 20 de fevereiro de 2022

NªTV: Pacificador

 
John Cena: DC sabor Troma. 

A primeira vez que ouvi falar do Pacificador foi quando li uma matéria comparando ao Comediante de Watchmen a ele. A outra vez foi o comparando a Homelander de The Boys. Se você conhece estes dois personagens, você deve imaginar o quilate da comparação. Pertencendo hoje ao universo da DC Comics, o personagem apareceu na versão mais recente de O Esquadrão Suicida (2021) e deixou claro toda a sua psicopatia por matar qualquer pessoa em nome da paz. A origem do personagem é antiga e ocorreu fora da DC, ainda na Charlon Comics em que foi apresentado como um pacifista em sua primeira aparição em 1966. Em 1988 sua personalidade foi reformulada para uma popular minissérie em HQ e seus traços de anti-herói se tornaram mais explorados - o que caiu como uma luva quando James Gunn buscava personagens, digamos, peculiares para sua missão resgate do Suicide Squad. Ali, ele já deixava claro sua ideia sobre o personagem: "Ele é o Capitão América Babaca". É por aí. Quando Gunn anunciou uma série sobre o personagem (novamente encarnado por John Cena) os fãs foram ao delírio e o delírio permaneceu cada vez que um novo episódio chegava no HBOMax. Nem precisa dizer que a série rompe completamente com o que se viu nas séries de herói concebidas pelo universo DC até aqui, já que Gunn tem aquele jeitinho particular de criar personagens dos quadrinhos. Foi isso que o atraiu a fazer os quase esquecidos Guardiões da Galáxia e topar o Esquadrão quando fatos controversos de seu passado vieram à tona. Se houve uma época em que produções sobre heróis eram levadas a sério, ela cedeu espaço para as piadinhas e, com Gunn, a galhofa e o grotesco passam a fazer parte deste estilo também. A abertura de O Pacificador já deixa claro que ele não leva nada disso a sério, embora, debaixo de toneladas de bobeira exista até uma mensagem de preservação do planeta e (o mais importante), um contraponto à forma como Pacificador é capaz de trucidar uma multidão em nome da paz. É verdade, se no primeiro episódio a plateia não faz a mínima ideia do que esperar, no segundo a ameaça em forma de borboletas cria os absurdos e os diálogos estapafúrdios até chegar no desfecho colocando Pacificador diante de uma espécie de espelho. Cada episódio encaixa uma pecinha na história do personagem e na forma controversa como ele constrói sua identidade, da relação com o pai supremacista (o convincente Robert Patrick), ao trauma com o falecimento do irmão caçula, sua amizade com Eaglie (sua águia de estimação) e com o seguidor Vigilante (o irresistível Freddie Stroma), passando até pelo amparo da equipe que passa a trabalhar com ele a mando de Amanda Waller (novamente Viola Davis em participação especial). Ao longo dos oito episódios, o Chris (o alter-ego do anti-herói) recebe novas camadas com a canastrice super-sônica do bombado John Cena. É engraçado por si só ver um sujeito daquele tamanho ser tão cretino, mas a série exige mais dele, que dá conta bonitinho do que precisa ser feito. Outro destaque o elenco é Danielle Brooks como a novata no grupo de Amanda Waller, que queria apenas um emprego para pagar as contas e se vê em situações inimagináveis. Seria um SPOILER dizer que a amizade que se constrói entre ela e o protagonista é mais uma prova de que debaixo de toda aparente falta de noção de Gunn se esconde um bom coração?  Depois de toda a geleca do último episódio, James Gunn não nega toda a trasheira dos tempo em que trabalhava nos estúdios Troma, só que agora, ele tem muito mais dinheiro para bancar suas sandices. 

Pacificador (Peacemaker / EUA - 2022) de James Gunn com John Cena, Danielle Brooks, Freddie Stroma Robert Patrick, Jennifer Holland, Steve Agee, Chukwudi Iwuji, Annie Chang, Lochlyn Munro, Neil Webb e Viola Davis. ☻☻

#FDS Oscar 2022: Summer of Soul

 
Harlem Festival: resgate histórico. 

Faz um tempo que tento escrever sobre o documentário Summer of Soul aqui no blog, mas já fiz e refiz o texto tantas vezes que estabelecer um #FimDeSemana dedicado aos recentemente indicados ao Oscar foi uma espécie de motivação para finalmente fazer um registro sobre o filme. Em cartaz no TelecinePlay o filme se revela uma daquelas obras obrigatórias - e isso torna a tarefa de escrever sobre ele um tanto complicada. O que escrevo aqui é quase uma lista de motivos pelos quais o filme precisa ser visto, já que trata-se do resgate de um registro histórico que ficou por muito tempo perdido em arquivos da televisão americana. Em 1969 (mesmo ano do Festival de Woodstock), seis fins de semana seguidos na cidade de Nova York foram marcadas pela realização do Festival Cultural do Harlem, um evento voltado para a população negra e hispânica que tomou conta do parque localizado no bairro. O diretor de televisão Hal Tolchin ficou atento ao Festival e registrou cerca de quarenta horas de material sobre os shows que aconteceram diante de uma multidão, mas que não encontrou interessados para sua exibição (daí o aposto:... or when the Revolution Could not be Televised / Ou quando a Revolução não poderia ser televisionada). Eis que mais de meio século depois, o produtor e músico Questlove resgatou este material e estreia como documentarista (indicado ao Oscar por sua tarefa). Se houvesse somente o resgate dos shows de Nina Simone, Stevie Wonder, Sly and The Family Stone, BB King e uma mistura irresistível de soul, gospel, jazz, sonoridades latinas e blues, o filme já mereceria uma visita. No entanto, o grande achado de Summer of Soul é saber construir uma narrativa para contextualizar o período em que aqueles shows aconteceram e, com isso, ampliar a importância do que se assiste. Em 1969, além de Woodstock o homem havia chegado à Lua, Martin Luther King havia sido assassinado, Malcolm X era uma figura influente, os Panteras Negras estavam ativos e a música estava derrubando fronteiras em sua mistura com política e psicodelia. Existem momentos conhecidos como o discurso incendiário (e polêmico) de Nina Simone, além de outros emocionados quando o falecimento de King é abordado. O filme consegue apresentar aqueles artistas e personagens que gravitavam em torno do evento (de seu idealizador até o prefeito de Nova York naquele tempo), além de realizar entrevistas com pessoas que estiveram presentes naqueles dias (sejam artistas ou espectadores) num verdadeiro resgate da memória para além das filmagens restauradas. Misturando música, política, moda, cultura, engajamento e muito mais, o filme consegue contextualizar toda a importância do evento e ainda deixar claro o motivo de seu esquecimento por tanto tempo ao longo da história. Conforme o filme avança, ele constrói uma experiência imersiva que causa a sensação de uma viagem no tempo. O filme desponta como um dos favoritos ao Oscar de documentário deste ano (praticamente empatado com o elogiado Flee) e, mesmo que não leve a estatueta para casa, seu valor histórico é inestimável. 

Summer of Soul (Summer of Soul: ...or when the Revolution Could not be Televised /EUA -2021) de Questlove com Mahalia Jackson, Stevie Wonder, Gladys Knight, Nina Simone, David Ruffin, Marilyn McCoo e Mavis Staples. ☻☻

sábado, 19 de fevereiro de 2022

#FDS OSCAR 2022: Encanto

 
Maribel e Bruno: a importância de ser comum. 

Servindo de recheio para o #FimDeSemana dedicado aos indicados ao Oscar deste ano está uma das três animações da Disney que estão no páreo da categoria este ano. Ao lado de Luca e Raya e o Último Dragão (que prometo comentar em breve), Encanto ocupa o posto de favorito, especialmente pelo seu apelo pop com tempero latino. Dos três foi o que mais ganhou destaque nos cinemas e ainda conta com uma trilha sonora inspirada que criou um verdadeiro hit com "We Don't Talk About Bruno", que se tornou o maior hit de uma trilha animada nos Estados Unidos desde "Let it Go" de Frozen (2013) - e vale destacar as reclamações dos fãs quando a música sequer foi submetida ao Oscar de canção original, deixando o posto para Dos Oruguitas que concorre ao prêmio da categoria. O longa também concorre ao prêmio de trilha sonora, o que é merecido, já que é importante deixar registrado que Encanto tem a estrutura de uma comédia musical, já que em vários momentos a música tem destaque e, o mais importante, torna-se fundamental para dar charme à história da família Madrigal. A trama é ambientada na Colômbia e gira em torno de uma família que se estabeleceu numa casa cercada de montanhas para se proteger da maldade do mundo (que aliás, foi o que os levou até aquele lugar). Os elementos fantásticos da trama ficam por conta de uma vela mágica, que não apenas os auxilia na construção de uma casa encantada como também oferece a cada membro da família um poder mágico. Estes fatores fizeram com que a família se tornasse uma espécie de liderança local, fazendo com que toda uma comunidade fosse construída em torno da residência Madrigal. No entanto, em torno de tudo que se considera uma verdadeira tradição, se escondem alguns segredos e quem se depara com eles é justamente Mirabel (voz de Stephanie Beatriz da série Brooklyn Nine Nine), a única da família que não possui poderes mágicos. Diante dos seus parentes extraordinário, é bastante compreensível que Mirabel tenha alguns conflitos pessoais por conta de ser uma pessoa comum. No entanto, esta busca por sua identidade e valor, seja o que faça a personagem enxergar que existe um verdadeiro risco à toda aquela estrutura e, parece, estar relacionada com um primo que foi banido e desapareceu sem deixar vestígios: o Bruno (este mesmo da música citada). Neste ponto o filme parece apontar para a presença de um vilão, mas o filme sabe exatamente como subverter esta ideia e demonstrar como uma pessoa que diz o que não gostamos de ouvir não necessariamente é uma pessoa ruim. Mirabel e Bruno acabarão descobrindo afinidades e serão importantes para que as rachaduras nas relações daquele lar sejam revistas e reconstruídas no final um tantinho apressado. Encanto é colorido, divertido, animado e adiciona novas simbologias a partir da ideia de se comparar com os outros e deixar que isso afete sua autoestima. Esta habilidade em abordar temas sérios com a leveza para cair no gosto das crianças e complexidade para que os adultos possam se entreter é o que faz a grande diferença no desenrolar do filme. A ideia deu tão certo que a Disney já prevê continuações para o filme (e confesso que We Don't Talk About Bruno é irresistível!). Depois de fazer sucesso nos cinemas, o filme já está disponível no Disney+ e vale uma conferida. 

Encanto (Encanto / Estados Unidos -2021) de Jared Bush, Byron Howard e Clarisse Castro Smith com vozes de Stephanie Beatriz, María Cecilia Botero, John Leguizamo, Mauro Castillo, Jessica Darrow, Andie Cepeda, Juan Castano e Maluma. ☻☻

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2022

#FDS OSCAR 2022: Mães Paralelas

 
Smit e Penélope: mães em conflito. 

Janis (Penélope Cruz) é uma fotógrafa que possui uma situação familiar que há muito tempo a incomoda. Criada pela avó no interior da Espanha, Janis cresceu com a ideia de descobrir o corpo de seu avô que foi enterrado nas redondezas junto a outros opositores à ditadura franquista (que perdurou por quase quarenta anos na Espanha). Nas primeiras cenas, quando a protagonista conhece Arturo (Israel Elejalde), profissional que auxilia famílias na busca por estes corpos desaparecidos, tomamos consciência da preocupação da personagem com a busca por seus ancestrais e a verdade por trás da História. Não é por acaso que logo depois ela estará grávida e convencida de que aquela pode ser a única chance de dar continuidade à sua família. Já no hospital, enquanto Janis é pura alegria por estar prestes a ser mãe, ela conhece Ana (Milena Smmit), que, assim como a parceira de quarto engravidou por acidente, mas em circunstâncias completamente diferentes. As duas darão a luz no mesmo dia e levarão suas filhas para casa enquanto a vida seguirá por novos rumos.  Acho que contar o que acontece a partir daqui seria estragar boa parte da experiência que é assistir o novo filme de Pedro Almodóvar, uma vez que para além dos elementos de melodrama (que  o cineasta tanto aprecia), ele procura traçar um paralelo entre política e as atitudes maternais de Janis ao longo do filme. Parece que o roteiro quer apresentar as contradições da personagem sobre o lhe parecia tão valioso e como isso convive com alguns segredos e mentiras que ganharão um peso insuportável em sua vida. No entanto, embora a ideia seja interessante, o desenvolvimento da trama poderiam ser mais trabalhados entre os atos que o roteiro apresenta, já que algumas situações poderiam ser mais trabalhadas na história já que aparecem e são deixados de lado sem muita cerimonia (o passado de Ana, a carreira de Teresa, a tensão sexual entre duas personagens). No entanto, Mães Paralelas ainda consegue construir seu drama central como se fosse um verdadeiro suspense amparado pelo ótimo trabalho de Penélope Cruz (premiada como melhor atriz no Festival de Veneza em 2021 e  indicada ao Oscar deste ano), que faz com que compreendamos suas atitudes, mesmo quando sabemos ser bastante condenáveis. A sutileza como Almodóvar cria um paralelo entre a parte política da história e a vida familiar pelo viés da maternidade pode passar desapercebida para algumas pessoas, mesmo que a marcante última cena ilustre a alegoria que está por trás de tudo. Mães Paralelas também concorre ao Oscar pela trilha sonora de Alberto Iglesias e bem que poderia ter sido indicada pela fotografia exuberante de José Luis Alcaine. Vale lembrar que o filme está em cartaz na Netflix, que preparou uma verdadeira retrospectiva com onze filmes do cineasta em seu catálogo recentmente. 

Mães Paralelas (Madres Paralelas/EUA - 2021) de Pedro Almodóvar com Penélope Cruz, Milena Smit, Israel Elejalde, Aitana Sánchez-Gijón e Julieta Serrano. 

INDICADOS AO OSCAR 2022: Ator Coadjuvante

Ciarán Hinds (Belfast) O filme de Kenneth Branagh é baseado em suas memórias de infância na conturbada Irlanda no final dos anos 1960. Portanto, não é por acaso que o carinho do diretor e roteirista tenha transbordado para a plateia em torno da carismática figura de Pop, ou, simplesmente, seu vovô encarnado com gosto por este veterano ator irlandês (que nasceu na cidade que dá título ao filme). Fazendo filmes desde os anos 1980 e com mais de cem produções no currículo, ele é (para muitos) um daqueles atores que você já viu o rosto em um monte de filmes, mas nunca lembra o nome. Chegou a hora de lembrar, não é tio Oscar!  Esta é a primeira indicação do ator pela Academia. 

Jesse Plemons (Ataque dos Cães) Surpresa entre os indicados, seria injusto dizer que a lembrança pelo trabalho discreto de Jesse no filme de Jane Campion foi um erro. Indicado pela primeira vez ao Oscar pelo bondoso irmão do protagonista grosseirão, ele é o toque de gentileza naquele universo marcado por atitudes rudes e grosserias. Embora seu personagens perca fôlego na segunda metade da história, o ator tem boas cenas ao lado de seus colegas de elenco, especialmente ao lado da noiva (na vida real) Kirsten Dunst. Famoso por sua versatilidade em vários filmes, ele ficou mais conhecido pelo seu trabalho na série Breaking Bad (2008-2014) .

JK Simmons (Apresentando os Ricardos) No meio dos concorrentes estreantes no Oscar, JK é o único que já foi indicado antes e que tem uma reluzente estatueta em sua estante (pela sua fenomenal performance como o professor agressivo de Whiplash/2014). O ator volta à categoria de coadjuvante por um trabalho que pouca gente colocaria entre as mais marcantes de sua carreira. Na pele do ator rabugento William Frawley, Simmons faz um verdadeiro milagre com o que tem em mãos - já que seu personagem não tem muito o que fazer na história além de ser um dos atores coadjuvantes da cultuada série "I Love Lucy". Simmons é a grande zebra da categoria. 

Kodi Smit-McPhee (Ataque dos Cães) Muitos apontam que o favorito entre os indicados é este ator australiano de 25 anos de aparência esguia (tem 1,90 de altura e pesa 75 quilos). Atuando desde os nove anos de idade, o filho do ator Andy McPhee, sempre teve gosto por papéis ambíguos e até sombrios em sua carreira. No aclamado filme de Jane Campion, sua capacidade de adicionar camadas imprevisíveis ao jovem Peter Gordon faz toda a diferença para que a trama funcione (e especialmente para que o desfecho faça sentido). Numa trama repleta de subtextos, sua performance enigmática como o rapaz alvo de escárnio dos cowboys da trama - é fundamental para prender a atenção da plateia. 

Troy Kotsur (No Ritmo do Coração) Ainda que não leve o Oscar para casa, este ator nascido no Arizona já fez história ao se tornar o primeiro ator surdo a ser indicado ao Oscar. Atuando há vinte anos, Kotsur tem apenas cinco filmes no currículo e chamou atenção por seu trabalho como o pescador surdo que precisa lidar com o sonho da filha em ser cantora (e o impacto que isso gera na realidade financeira da família). O mais interessante é que No Ritmo do Coração foi um filme que ganhou a plateia aos poucos desde o meio do ano e que teve fôlego para colocar a performance emocional de Troy entre os favoritos do ano. Se levar para casa, o Oscar estará em boas mãos. 

O ESQUECIDO: JAMIE DORNAN (Belfast) Eu confesso que esperava ver a Academia fazer média com Ben Affleck (The Tender Bar) na categoria, mas esperava mais ainda ver Jamie entre os indicados a melhor ator coadjuvante. Muitos críticos se renderam ao fator fofura de seu trabalho como o pai do menino protagonista de Belfast. Com pinta de galã e carisma de sobra, o ator confirma aqui que conseguiu se reinventar nos últimos anos depois que passou a procurar papéis distantes do vivido na trilogia 50 Tons de Cinza (maior prova disso é a galhofa de Duas Tias Loucas de Férias/2021 que está no HBOMax). Quem diria que sentiriam falta de Christian Grey entre os indicados ao Oscar! Chora não, Jamie. Fica para a próxima. 

PL►Y: Um Lugar

 
Robin Wright: bela estreia como cineasta. 

Depois de quatro décadas de carreira, acho que ninguém duvida que Robin Wright é uma atriz talentosa. Embora o Oscar a ignore sistematicamente, mesmo quando ela era favorita ao prêmio de coadjuvante por viver a eterna Jenny de Forrest Gump (1994), a atriz sequer foi indicada. A consagração absoluta da artista veio com a série House of Cards (2013-2018), que a indicou e a premiou por vários anos seguidos nas premiações televisivas. Quando já não precisava provar nada para ninguém, Robin revolveu se aventurar em uma nova tarefa em Hollywood, a de direção. Ao julgar pelo que a atriz faz em Um Lugar, ela leva jeito para coisa (e os elogios quando o filme foi exibido no Festival de Sundance só comprovam isso). Apesar do filme ser uma produção modesta e que pode ser considerada de risco financeiro baixo (poucos atores, poucas locações...), o filme tem um grande risco para uma cineasta estreante, já que diante deste quadro minimalista, ela possui o grande desafio de cativar o espectador com os poucos recursos que tem em mãos, sobretudo no apelo da dor de sua protagonista que resolve se afastar do mundo. Robin traz para si o desafio de carregar o filme nas costas na pele de Edee, uma mulher que resolve viver numa casa no meio das montanhas, sem carro, telefone, computador, celular ou  internet. Sua companhia se resume a um monte de enlatados que lhe serve de alimento enquanto opta pelo isolamento. Desde o início temos pistas de que algo bastante traumático aconteceu com a personagem, no entanto, as paisagens montanhosas belíssimas escolhidas para esta nova fase de sua vida podem até evocar a ideia de que ela está no paraíso, mas a coisa complica quando a natureza mostra-se ameaçadora com as visitas de um urso e um inverno rigoroso que pode tornar a vida de Edee mais curta do que ela imagina. Se existe até aqui elementos complicados a serem trabalhados (luto, depressão, autoflagelo, suicídio...) a longa catarse da protagonista muda de rumo quando ela recebe a visita de Miguel (o sempre bom Demián Bichir), que também tem sua cota de fantasmas a superar e disposição para fazer Edee tomar as rédeas daquele ambiente desafiador. Um Lugar marca assim uma bem vinda transição na personagem, que volta a descobrir sentimentos sobre si mesma que pareciam ter desaparecido em meio às dores que precisou lidar ao longo do caminho. É um filme simples, mas que trata de temas delicados com bastante sensibilidade e desenvoltura. Talvez, por já ter sentido vontade de me isolar da loucura do mundo atual várias vezes, o filme me cativou ao sair gradativamente da angústia para uma mensagem esperançosa ao final. Por esta transição trabalhada sem pressa ou pieguice, Robin Wright merece crédito para seu trabalho como cineasta. 

Um Lugar (Land/EUA-2021) de Robin Wright com Robin Wright, Demián Bichir, Sarah Dawn Pledge, Kim Dickens, Brad Leland e Warren Christie. ☻☻ 

terça-feira, 15 de fevereiro de 2022

4EVER: Arnaldo Jabor

 
12 de dezembro de 1940 ✰15 de fevereiro de 2022

Nascido na cidade do Rio de Janeiro, Arnaldo Jabor se tornou um dos nomes mais importantes do cinema brasileiro. Filho de um oficial da aeronáutica e uma dona de casa, Arnaldo foi um dos nomes mais importantes do período que ficou conhecido pelo movimento do Cinema Novo. O cinema de Jabor era marcado pela influência do neorrealismo e a nouvelle vague. Sua estreia em longa-metragem aconteceu em 1967 com A Opinião Pública. Seus filmes fizeram muito sucesso no Brasil e no exterior, ganhando prêmios importantes como o Urso de Prata no Festival de Berlim (com Toda Nudez Será Castigada/1973) e o prêmio de Melhor Atriz para Fernanda Torres no Festival de Cannes (com Eu Sei Que Vou Te Amar/1984). Durante sua carreira, Jabor dirigiu sete longa-metragens, o último deles foi A Suprema Felicidade (2010) lançado após um hiato de quatorze anos, período em que se dedicou à  literatura e tecer comentários sobre notícias no Jornal Nacional da Rede Globo. Jabor faleceu em decorrência de complicações decorrentes de um acidente vascular cerebral sofrido no final de 2021. 

sábado, 12 de fevereiro de 2022

4EVER: Ivan Reitman

27 de outubro de 1946 ✰ 12 de fevereiro de  2022

Ivan Reitman nasceu na Eslováquia, filho de um casal de judeus (sua mãe sobreviveu ao campo de concentração de Auschwitz e seu pai era um combatente da resistência subterrânea). Sua família se refugiou no Canadá em 1950, anos depois Reitman se formou na Universidade McMaster, onde concluiu sua graduação de bacharel em Música. Durante o curso, Ivan dirigiu vários curtas que já demonstravam seu gosto por fazer filmes. Embora tenha estreado como cineasta em 1971, seu primeiro sucesso foi o juvenil Almôndegas (1979), mas nada que se compare às bilheterias de Os Caça-Fantasmas I e II (1984 e 1989), Irmãos Gêmeos (1988), Um Tira no Jardim de Infância (1990) e Space Jam (1996). Famoso por suas comédias, seu tipo de humor perdeu força ao final dos anos 1990 e no século XXI sua carreira foi mais dedicada à produção cinematográfica - que inclui Amor Sem Escalas (2009), filme dirigido pelo filho Jason Reitman que recebeu seis indicações ao Oscar, incluindo aos dois pela produção do filme. Ivan Reitman faleceu enquanto dormia sem sua residência. 

terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

INDICADOS AO OSCAR 2022

Ataque dos Cães: a vez da Netflix?

Hoje foram divulgados os indicados ao Oscar a ser realizado no dia 27 de março e gerou uma enorme onda de comentários, principalmente por conta de quem ficou de fora dos nomeados - especialmente uma esnobada (Lady Gaga) que ninguém esperava. Prometo que até o dia da entrega das estatuetas comentarei os indicados nas categorias de atuação, direção e melhor filme, mas por enquanto vou divulgar a lista dos indicadosVale destacar que Ataque dos Cães de Jane Campion é o filme que mais conseguiu indicações, com 12 lembranças pela Academia e aumenta se esta será a vez em que a Netflix levará o prêmio de melhor filme para casa. A véspera da cerimonia, postarei minhas apostas em todas as categorias. A seguir todos os indicados (e faça suas apostas):  

Melhor Filme

Melhor Direção

Melhor Ator

Melhor Atriz

Melhor Ator Coadjuvante

Melhor Atriz Coadjuvante

Melhor Roteiro Original

Melhor Roteiro Adaptado

Melhor Fotografia

Melhor Trilha Sonora Original

Melhor Canção Original
“Somehow You Do” (Four Good Days)

Melhor Edição

Melhor Figurino
Cyrano

Melhor Cabelo e Maquiagem

Melhor Design de Produção

Melhor Filme Internacional
Lunana (Butão)

Melhor Documentário em Longa-metragem
Ascension
Attica
Writing with Fire

Melhor Documentário em Curta Metragem
Audible
Lead Me Home
The Queen of Basketball
Three Songs for Ben Azir
When We Were Bullies

Melhor Animação em Longa Metragem
Raya e o Último Dragão

Melhor Animação em Curta Metragem
Affairs of the Art
Bestia
Robin Robin
Boxballet
The Windshield Wiper

Melhor Curta Metragem em Live-action
Ala Kachuu – Take and Run
The Dress
The Long Goodbye
On My Mind
Please Hold

Melhor Som

Melhores Efeitos Visuais
Free Guy

sábado, 5 de fevereiro de 2022

PL►Y: Playlist

 
Sara Forrestier: adorável estreia. 

Parece simples, mas filmes despretensiosos tem um desafio gigante pela frente: tornar interessante uma história simples, geralmente calcada em personagens comuns em seus fatos cotidianos. Quando ele cumpre este objetivo o resultado já soa agradável, o melhor é quando ele consegue extrapolar uma fórmula que parece gasta e a experiência pode se tornar uma grata surpresa. A surpresa define minha sensação enquanto assistia a Playlist, filme de estreia de Nine Antico que é narrado com uma desenvoltura tão despojada, que por alguns minutos eu esqueci que estava assistindo um filme. O filme conta a história de Sophie Legal (vivida por Sara Forestier, que honra o sobrenome da protagonista), uma garçonete de 26 anos que pretende dar um novo rumo em sua vida. Cansada com a rotina no trabalho e a grana sempre curta, ela decide mudar de emprego e consegue trabalho na área de divulgação das publicações de uma editora especializada em HQs graphic novels. A própria Sophie curte desenhar e aos poucos começa a se aproximar da ideia de realizar uma publicação do gênero, embora o roteiro sempre deixe uma  crítica aqui e outra ali ao seu trabalho, Sophie se mantém otimista se torna uma daquelas personagens para qual torcemos de graça. A vida financeira e as grosserias do novo chefe (que desde o primeiro contato já ressalta que não é uma pessoa fácil de lidar, mas Sophie encara o desafio) junta-se à vida amorosa da protagonista que está um pouco bagunçada depois de seu envolvimento com Jean (Pierre Lottin), um dos cozinheiros do restaurante em que trabalhava. Esta confusão amorosa faz com que a busca por um novo amor se torne presente no seu dia-a-dia e acrescenta charme à produção a forma como ela identifica seus futuros pretendentes, que sempre se revelam sujeitos complexos em diálogos interessantes lapidados com maestria pela diretora/roteirista e o elenco. Despojado e descolado, o filme consegue manter uma tocante leveza mesmo diante das situações mais complicadas que a personagem enfrenta ao longo da narrativa, sem perder de vista as conversas francas com as amigas, especialmente a sempre presente Julia (Laetitia Dosch) que sonha em se tornar uma atriz reconhecida (e dividem uma das cenas mais divertidas em um curso de primeiros socorros que já assisti em um filme). Espirituoso e enxuto em sua duração, Playlist é uma ótima estreia em longas de ficção para Nine Antico, já que traz marcas de seu trabalho em documentários para televisão e sua escrita ágil (já apresentada nas graphic novels escrita por ela). Playlist (uma alusão não às músicas indies que tocam durante à sessão, mas à lista de alegrias e desilusões da vida) é um filme tão gostoso de assistir que quando termina deixa aquela sensação que poderia durar mais um pouco. 

Playlist (França/2021) de Nine Antico com Sara Forestier, Laetitia Dosch, Pierre Lottin, Andranic Manet, Grégoire Colin, Lescop e Bertrand Belin. ☻☻